No Ciclo de Cinema que entende fazer uma viagem pelos filmes sujeitos a censura em diversas latitudes, épocas e regimes, a Cinemateca apresenta esta terça-feira três obras muito diferentes umas das outras.
Na sessão das 15.30 passa «Mãos ao Ar», que Jerzy Skolimowski rodou em 1967 para ser exibido no Festival de Veneza desse anos, mas que foi retirado e proibido pelas autoridades polacas.
Agastado, o realizador refugiou-se em Londres para iniciar um percurso internacional com títulos de qualidade muito irregular.
Em 1981 regressou a casa e pegou novamente na obra proscrita e acrescentou-lhe um prólogo com cerca de um quarto de hora, sobre o tema: “Quem éramos? Quem somos?”
O resultado dessa criação em dois tempos distintos explica o pouco entusiasmo, que suscitou.
Na sessão das 19 horas pode-se ver um filme mudo soviético datado de 1927: «Três na Rua Mechtchanskaya», realizado por Abram Room. O tema exasperou os censores do regime, cada vez mais firmes numa forma de puritanismo, que nada devia aos dos do Osservatore Romano: num pequeno apartamento de Moscovo habita um casal e um amigo do marido vindo da província.
Aproveitando uma ausência temporária do legítimo, a mulher partilha-lhe a cama com o recém-chegado, estabelecendo-se uma cumplicidade nesse “affaire à trois”.
Convenhamos que o regime estalinista já perfilhava a tese de serem obrigatórias as virtudes públicas, mesmo havendo vícios recatadamente escondidos no espaço privado. Daí a proibição inevitável do filme.
Na sessão da noite (21.30) passa «Soldado Azul», cuja estreia em 1970, teve a dimensão de um relevante acontecimento: vivia-se a guerra do Vietname e não era difícil estabelecer paralelismos entre os massacres com napalm na Indochina e os das aldeias índias pelo mesmo Exército nos finais do século XIX.
Completamente esquecido, o filme de Ralph Nelson incomodou os que defendiam a estratégia imperialista, acabando proibido em muitos países. Em Portugal, como Marcelo Caetano ainda alimentava a possibilidade de adiar o fim do regime com a sua suposta «Primavera», o filme passou com os cortes inevitáveis nas cenas mais explicitas. Mas falando-se de exações cometidas pelas tropas portuguesas em África, havia quem se servisse da abordagem deste filme para colocar em equação a legitimidade ou não de fugir á Guerra Colonial. Por isso mesmo, essa foi época de muitas passagens a salto da fronteira com a Espanha e, depois, a dos Pirinéus, para encontrar refúgio em França, na Bélgica ou na Suécia.
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