Costumo dizer amiúde que o realizador Manoel de Oliveira bem me tramou.
Andei anos a acreditar que ele conseguia enganar a morte, e ei-lo, aos cento e seis anos, a tomar o chá da meia-noite. Uns meses antes vira-o, todo airoso, na esplanada da Pastelaria Suíça, acompanhado da esposa e reforçara a ideia de haver quem fora esquecido pela Ceifeira referida numa canção folclórica alemã do século XVII.
É que, como a avó Josefa de José Saramago, também eu acho a vida tão bonita, que irei ter muita pena de dela me desapegar. (Muito embora não veja qualquer contradição em defender a Morte Assistida a pedido do próprio, entenda-se!).
Desde miúdo que não me conformo com o envelhecimento e com a finitude da vida. E milhões de outros seres humanos pensam de igual modo, o que justifica a atenção dada atualmente pela Ciência para tornar possível a vida eterna.
Com os progressos da medicina, o velho sonho da imortalidade está a ressurgir, concertando-se com os avanços na biologia e na informática. Por todo o mundo desenvolvido há cientistas e investidores privados a empenharem-se ativamente nesse objetivo.
Uma hipótese assenta na criogenia: nos arredores de Sheffield (Inglaterra) a “Cryonics” congela os que apostam na possibilidade de virem a ser acordados num futuro indefinido, mas em que já haja cura para a velhice e para a morte. São encerrados em cápsulas de alumínio a exemplo dos 134 pacientes que estão armazenados nas grandes redomas frigoríficas da Alcor Life Extension Foundation, onde James Bedford foi o primeiro a prestar-se a tal experiência em 1967.
Há quem decida não congelar o corpo todo, mas só o cérebro, por acreditar que será mais fácil a criação de corpos artificiais do que a cura para a morte. A ser assim, quando puderem ver os seus cérebros acordados, será possível implantá-los, com todas as correspondentes memórias, num invólucro de aparência eternamente jovem.
Se a criogenia parece opção de duvidoso sucesso há quem aposte na clonagem humana, com tecnologia capaz de criar tantas cópias de uma matriz original, quantas as pretendidas. Assim, seria apenas uma questão de transmitir conhecimentos e recordações para essas réplicas, tão só a anterior se aproximasse do seu tempo útil de utilização. Para o neurólogo Ken Heyworth somos sobretudo informação, que não tardaremos a conseguir deslocar à velocidade da luz, vencendo o constrangimento de nos vermos cingidos a um minúsculo planeta demasiado distante de qualquer outro, onde a vida possa ser possível.
Em Berkeley o filósofo John Searle defende a possibilidade de aumentar as capacidades do corpo através da inserção de dispositivos tão simples como um aparelho auditivo ou uns óculos. E que será uma autêntica máquina da consciência. Esta alternativa continua, porém, a ser bastante improvável de se tornar possível a curto e médio prazo: mesmo com cavalos ou cães, mais de metade dos clones acabam por morrer durante a gestação.
No entanto, uma cientista norte-americana transferiu, tanto quanto possível, as informações da esposa para o sistema informático de um robô, o protótipo biónico Bina 48. Mas, mais do que o sucesso científico, o resultado tem sobretudo a ver com a história de amor, que unia as duas.
- texto decorrente do documentário «L’Immortalité: la dernière frontière» de Sylvie Blum (2016)
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