Nos anos em que por lá andei nos verões dos finais da década de oitenta, inícios da de noventa, a Islândia ainda não era conhecida pelo comportamento venal dos seus banqueiros, nem por ter Piratas a quase ganharem eleições. Na época, além da sua atividade piscatória e dos vulcões, conhecia-se dos islandeses o seu gosto pela leitura, que os tornava nos mais ávidos consumidores de livros per capita à escala mundial. O que não admira, pois os longos invernos são marcados pelo frio extremo e pela escuridão, que tornam apetecíveis os serões de leituras no recato do lar.
Numa população tão escassa também seria improvável encontrar matéria para dar fôlego a romances policiais, mas tudo indica que a moda do género nos países escandinavos contagiou o seu vizinho mais ao norte. Por isso temos hoje Arnaldur Indridason como o representante de uma escola de literatura desse tipo com crescente adesão dos leitores europeus: os seus livros vão-se encontrando com maior ou menor facilidade nas livrarias lusas e dos demais parceiros comunitários.
Datado de 2001, «La Femme en vert» - que li agora na sua versão francesa - ainda é um romance frágil na sua estrutura, mas já aponta para os objetivos do autor em questionar a história islandesa mais recente e a forma como se relacionam homens e mulheres.
Tudo começa com uma polícia, Elinborg, a fazer um relatório sobre a descoberta de uns ossos no bairro de Thusold.
O caso começa por não ter relevância, dando-nos inicialmente o ensejo para conhecer algo mais sobre esta personagem: tendo passado os quarentas, é casada em segundas núpcias com um mecânico apreciador dos seus dotes culinários e que lhe aceitou em casa os três filhos do anterior matrimónio, acrescentados ao que ele também tivera. Com formação em geóloga, faz parte do muito restrito clã feminino no Departamento de Homicídios de Reiquiavique.
Conhecemos-lhe depois os colegas: Sigurdur Oli, que tarda em decidir-se a casar com Berghora com quem vive há vários anos. E, sobretudo, Erlandur, que terá importância crescente no romance, porque a filha, Eva Lind foi encontrada em coma num descampado perto da maternidade, aonde pretendia aparentemente chegar devido à sua avançada gravidez. O feto acaba por perder-se e ela (sobre)viverá em estado crítico durante todo o curso da história.
Em casa, nessa noite, Erlandur “sentiu o profundo silêncio que reinava na sua vida. Sentiu a solidão que o acossava. O peso dos dias cansativos a formar uma cadeia, que ninguém conseguiria quebrar, enrolava-se à sua volta, oprimindo-o, asfixiando-o.” (pág. 67)
Nesta avançada altura do romance ainda pouco encontráramos do que o definiria como um policial.
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