sábado, maio 11, 2019

(VOL) As estufas de Almeria


Nos hipermercados encontramos muitos legumes e frutos provenientes de Espanha. E é assim por toda a Europa como o tenho constatado nas frequentes viagens à Holanda, quando procuro alguma etiqueta de produtos portugueses nos Albert Heijn e dou, invariavelmente, com as que identificam os produtos provenientes do país vizinho. E, já agora, de outros destinos como o Chile, a Austrália ou a África do Sul, que revelam um sentido de concorrência bastante mais competitivo do que o dos nossos empreendedores nas atividades agroalimentares.
Ao dar com uma reportagem de Simon Reeves, repórter da BBC, na região de Almeria, confirmamos o carácter industrial de uma produção, que se estende por quilómetros e quilómetros de estufas e conta com custos baixos graças aos salários de miséria pagos aos trabalhadores, quase todos emigrantes oriundos da África subsariana. Revoltantes são, igualmente, as condições de alojamento situadas nas adjacências dos locais onde se sujeitam à ignóbil escravatura, ademais vendo-se obrigados a pagar renda pela ocupação de tão sórdidos tugúrios.
Não fosse a vergonha a que se sujeitariam por terem falhado na tentativa de conquistarem o almejado sonho europeu, a maior parte desses explorados regressaria às suas terras de origem. Mas, entre pouparem-se ao vexame junto dos seus, ou continuarem a sofrer regimes intensos de trabalho, em temperaturas dignas de saunas, e em posições inevitavelmente danosas das suas colunas vertebrais, a escolha é a óbvia. Milhares de pessoas mobilizadas para as mais desvairadas utopias sofrem as desilusões de quem chegou a um beco sem saída e só tem a morte como libertação.
Indignado, o inglês questiona se não seria possível as grandes marcas de distribuição deslocarem auditores aos locais donde provém os produtos, que compram em grande quantidade, para exigirem condições de trabalho mais humanas para quem os cultiva, rega e colhe.
Santa ingenuidade! A lógica capitalista não pressupõe que os povos da Europa do Norte usufruem de um maior bem estar graças aos custos mais baratos do que consomem e importam dos países do Sul? E que estes, vendo esmagados os preços, não veem outro recurso senão explorarem desapiedadamente os desgraçados, que atravessam precariamente o Mediterrâneo para aqui verem morrer na praia os sonhos de que vinham imbuídos?
É só uma questão de olharmos para as estufas, que se multiplicam pelo Ribatejo e pelo Alentejo. Se aferirmos o que lá se passa daremos com nepaleses, tailandeses e outros «esses», sujeitos a tão hediondo tratamento quanto o dos que vendem a força de trabalho nas de Almeria.

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