terça-feira, janeiro 23, 2018

As Partes do Todo (XII) - 23 de janeiro de 2018: Mongólia dos anos 90 e A Guerra dos Mundos

1. Em 1990 um grupo de franceses decidiu atravessar a estepe mongol a cavalo. A URSS acabara de implodir e deixara de ter grande influência nas suas repúblicas-satélite.
A Mongólia via-se, então, obrigada a inventar o seu novo papel num mundo, que não deixava de ter de contar com o poderio dos dois gigantes com que continuava a ter fronteiras - a Rússia e a China -, mas com a atenção também focalizada no mundo capitalista apostado em ali entrar em força para lhe explorar o rico subsolo.
Procurando imitar as grandes viagens científicas de antanho, os viajantes prepararam as máquinas fotográficas, os moleskines e as barras de cereais para irem ao encontro de paisagens proibidas a estrangeiros desde os anos 20. O exotismo colidia com o sistema dito comunista em deliquescência.
Se foi a abertura política a leste a permitir tal expedição, ela começou por ser sugerida pela descoberta de um texto de Guilherme de Rubrouck enviada a São Luís no século XIII: “Quando começámos a contactar com esses bárbaros, concluí que chegara a um outro mundo. Rodearam-nos montados a cavalo depois de tanto os termos esperado enquanto descansavam  sombra das carroças negras. A primeira coisa, que nos perguntaram foi se alguma vez já ali estivéramos…”
2. Eu sei qual era a finalidade desse tipo de filmes, rodados em Hollywood, quando a Guerra Fria se exacerbava e a caça aos comunistas excitava os ânimos crapulosos de uns e intimidava muitos dos que tinham aderido a tais ideias com a naturalidade de quem nelas identificava os aliados durante a grande luta antifascista. A verdade é que acho piada a títulos como o que agora vi: «A Guerra dos Mundos», `realizado em 1953 e baseado no romance de H.G. Wells. Protagonizado por Gene Barry e Ann Robinson, desde a primeira cena que se compreende de quem verdadeiramente se fala quando se pinta os marcianos invasores com os piores adjetivos. Invejosos, frios, insensíveis, assassinos - todo um conjunto de características exploradas pelos propagandistas mais maniqueístas para diabolizar os novos inimigos soviéticos.
Respeitando a intriga criada pelo autor britânico, Haskin utiliza efeitos especiais vistosos para a época, mas hoje de uma ingenuidade curiosa, ao mesmo tempo que explora as potencialidades do Technicolor, com que os estúdios procuravam manter as audiências nas salas de cinema, porque visualmente mais apelativos do que a oferta televisiva.
Onde Haskin inventa, e mal!, é quando quase faz corresponder a chacina dos marcianos pelas bactérias terrestres a um milagre divino: já não bastando a ideologia anticomunista, ainda a quis embalar no diáfano manto de uma suposta santidade cristã.

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