quarta-feira, abril 10, 2019

(DL) «A Confraria dos Espectros» de João Carlos Alvim


Injusto foi o quase alheamento em torno do romance «A Confraria dos Espectros», que João Carlos Alvim publicou no ano transato. A não ser Luís Caetano nos seus imperdíveis programas na Antena 2 não vi, nem ouvi referências sobre um livro, que nos remete para o verão de 1833 na altura em que os exércitos já estavam a batalhar entre Almada e a Cova da Piedade, com os miguelistas a sentirem-se à beira de hecatombe apocalítica. É nessas circunstâncias, que um aristocrata do Cartaxo, ligado à causa absolutista, embarca o filho Luís num navio francês, que o pode levar para França a fim de prosseguir formação no seleto colégio de Saint-Sulpice. À despedida terá o padrinho, um frade meio alucinado, a impor-lhe um futuro dedicado à causa do catolicismo, que o novo poder tenderá a subjugar.
Há também a frustrada revolta de estudantes em Frankfurt, que procuram reproduzir no grão-ducado local as ideias republicanas herdadas da Revolução Francesa.  Vítimas colaterais da repressão os judeus da cidade, ainda há pouco libertos da obrigatoriedade de se manterem acantonados no gueto, veem organizar-se em seu torno a preparação de assassino progrom.
Estamos perante um período de grandes transformações históricas: um mundo decadente parece estar na iminência de ruir para dar lugar a outro, que promete outros valores e formas de governar. Mas não será guerra de resultado tão óbvio quanto, de início, parece sorrir ao lado mais progressista. Na sombra organizam-se os que juram contrariar, tanto quanto possível, uma dinâmica, que os tende a atropelar.
O primeiro romance daquele que foi um dos grandes nomes do mundo editorial português nas últimas décadas, irá abordar essa luta entre quem aposta às claras numa sociedade orientada para o progresso e os que, clandestinamente, conjuram para a deitar a perder. E conclui-se, quando outro acontecimento histórico já anuncia novos saltos qualitativos nessa permanente dialética entre o que existiu e o que, só a custo, virá a prevalecer como nova realidade: a Primeira Guerra Mundial.

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