sexta-feira, abril 19, 2019

(DIM) «Tokyo!» de Leos Carax. Michel Gondry e Bong Joon-Ho (2008)


Das várias vezes em que estive no Japão recordo o quanto me admirei com a capacidade de organização daquele povo e da sua gentileza, mormente em Miike, onde o facto de as autoridades locais constatarem ter chegado um navio português ao seu porto foi motivo bastante para organizarem rápidas celebrações de boas-vindas aos que reconheciam como descendentes dos que, quase cinco séculos atrás ali haviam feito chegar algumas das inovações já então comuns no Ocidente. Não só as armas de fogo, mas sobretudo o pão-de-ló, as cartas de jogar e outros legados conservados no museu local.
Compreende-se, assim, a curiosidade com que me decidi a ver estes três filmes, já que «Tokyo!» mais não é do que a associação de outras tantas curtas-metragens, cada uma com 35 minutos de duração.
Michel Gondry incumbiu-se de «Interior Design», a história de um par de namorados, que se vem provisoriamente instalar no exíguo apartamento de uma amiga dela na cidade, a fim de arranjarem empregos e um espaço só seu. Ele é realizador de cinema, mas só encontra emprego mal remunerado numa loja onde se incumbe de embrulhar as compras dos clientes. Progressivamente esquecida por todos à volta a rapariga acaba transformada numa cadeira, onde quem nela se senta não toma consciência de quem ali se faz passar despercebida. Trata-se, pois, de uma história sobre a acomodação ao vazio.
Leos Carax recorre, como sempre, ao ator que lhe serve de alter ego: Denis Lavant. Ele é Merde, um monstro saído da rede de esgotos para palmilhar as ruas da cidade, aí semeando o pânico, a morte, a destruição. Exemplifica, pois, os que vivem completamente à margem da sociedade e por ela nunca conseguirão ser compreendidos.
O coreano Bong Joon-Ho recorre aos bizarros hikikomori, pessoas eivadas de uma forma extrema de agorafobia, porquanto escusam-se a ir à rua, exceto em caso de terramoto. A solidão, que qualquer pessoa normal consideraria insuportável, constitui para eles um motivo de conforto. O estranho é a sociedade comportar número crescente de quem sofre tal fobia condenando a cidade a um cenário desértico.
São três estórias sobre as fragilidades do espaço urbano, quando a sociabilidade se torna característica cada vez mais rara nos comportamentos de quem nele vive. Mas, também, a imagem muito negativa (e injusta!) de um Japão bem diferente daquele que tive o privilégio de conhecer.

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