sábado, abril 13, 2019

(DIM) «Chaco» de Daniele Incalcatierra e Fausta Quattrini (2017)


Daniele Incalcatierra recebeu de herança uma propriedade paraguaia com cinco mil hectares, comprada quando o pai era embaixador em Assunção.  O que fazer quando se vive em Itália e se fica com um legado tão distante? A resposta parece-lhe óbvia ao aterrar no país latino-americano: dado que a propriedade situava-se no antigo território dos índios nandeva nada melhor do que criar uma reserva natural, Arcadia, que seriam eles a gerir.
Porque o país ainda tinha como presidente um homem de esquerda, Fernando Lugo, não lhe foi difícil conseguir reconhecimento da pretensão através de um decreto-lei por ele sancionado. Era desconhecer que um golpe de Estado logo o derrubaria para o substituir por um defensor dos direitos dos latifundiários, apostados em desflorestarem aceleradamente o país e criarem vastas pastagens e plantações de soja, sem esquecer as clandestinas, mas muito proveitosas, culturas de marijuana ou cocaína.
As dificuldades de Daniel avolumam-se dado nem sequer conseguir acesso à sua propriedade, porque rodeada totalmente pela de um uruguaio, que anseia erradicar aquela pequena mancha florestal no centro do latifúndio adquirido ilegalmente. Num país marcado pela corrupção, Incalcatierra vê-se na pele do personagem do «Processo» de Kafka: os juízes e procuradores escusam-se a impor a legalidade a quem baseia na força a imposição de uma ocupação de facto de terras, que nunca lhes deveriam ser confiadas.
Incalcatierra multiplica-se em contactos com os diversos poderes paraguaios e consegue apoio em rádios, que divulgam a sua luta de David contra poderosos Golias. Até mesmo o Papa Francisco, antes de aterrar na capital, manifesta-se sensibilizado por tão celerada demonstração das injustiças colonialistas.
Chegamos ao fim do filme, com o protagonista manifestamente esgotado por tanto esforço investido em vão. Mas a imagem final permite manter alguma esperança: vemos uma viúva-negra, aranha inofensiva se não for incomodada, mas com mordedura fatal se for incomodada. O que os poderes corruptos paraguaios estão a impor aos seus índios lembra a pertinência dessa realidade natural.

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