quarta-feira, julho 15, 2020

(DL) O dia de Iemanjá


Na edição da Granta dedicado ao tema das Fronteiras, o primeiro conto é de Adriana Lisboa, escritora brasileira nossa conhecida desde que ganhou o Prémio Saramago. E o tema não podia ser mais atual, sobretudo para quem ficou no sítio onde nasceu e viu partir os filhos para outros horizontes, outras fronteiras.
A narradora regressa a casa, porque a mãe fora operada  de urgência a uma doença, que descurara anos a fio. Ora, na década anterior, o convívio entre ambas espaçara-se, quase não se verificara, apesar das gratas memórias do passado. Que regressam em força na semana que medeia entre a chegada e o passamento da doente no dia de Iemanjá.  
Adriana Lisboa revela uma subtileza e uma depuração no texto em que, às tantas, constata: Um corpo numa morgue é somente um corpo numa morgue, e os olhos da gente entram em curto-circuito, não entendem como é possível que não seja você (e não é) se é você. A saia e a blusa e o sapato que escolhemos — presentes de Natal que você não teve tempo de usar. Parece-me que houve um velório. Era dia de Iemanjá. Depois levaram o corpo para o crematório e os mais católicos da família ficaram ofendidos com isso. Parece-me que havia, entre eles, lugar para tanto.”
Meia dúzia de páginas de Literatura com maiúscula...

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