domingo, agosto 30, 2020

(DIM) A Vida e a Morte de Marina Abramovic


Robert Wilson é um dos grandes encenadores do nosso tempo. O Festival de Teatro de Almada tem apresentado alguns dos seus trabalhos (o mais recente foi com Isabelle Huppert no ano passado) e, no início dos anos 90, o galerista Luís Serpa convidou-o para aquela que designou como a sua Lisbon Experience.
Alguns documentários têm-nos feito, igualmente, aceder a outras criações exultantes, que só podemos lamentar não ter podido assistir ao vivo, mas demonstram a sua arte. Uma delas aconteceu na Estónia, quando encenou uma das obras maiores de Arvo Pärt: Adam’s Passion e conseguiu, através dos atores-esculturas a movimentarem-se em cena, dar o devido valor ao silêncio entre as notas musicais, que  o compositor tanto enfatiza como imprescindível para se entender a vertente divina a elas subjacente.
Vimos agora Bob Wilson´s Life and Death of Marina Abramovic, realizado por Giada Colagrande enquanto making of do espetáculo levado à cena em 2012 e com a participação superlativa da performer, de Willem Dafoe, de Antony Hegarty e do grupo de música tradicional sérvia liderado por Svetlana Spajic.
Com um tal núcleo de gente talentosa esperar-se-ia um documentário enquadrável na classificação máxima de cinco estrelas. Mas elas não chegam para dar conta do quanto foi jubilatória a experiência desses 57 minutos: a notável sagacidade de Wilson e Abramovic em pegarem na biografia dela, sobretudo da infância, que Baudelaire dizia ser a origem da genialidade, e transformarem os acontecimentos por ela vividos numa dramaturgia empolgante, ademais debitada pela histriónica interpretação de Willem Dafoe, que continua a ser um dos mais versáteis atores do nosso tempo. E, igualmente, a música de Antony Hegarty (hoje Anohni), cuja voz há quem associe à dos anjos, mesmo quando aqui enverga trajo a lembrar a mozartiana Rainha da Noite. E sem esquecer os sons balcânicos, cuja beleza nunca nos deixam de encantar.
Inicialmente Marina Abramovic pretendia que Wilson lhe encenasse o funeral, ele decidiu-se por tomá-lo como início e depois partir em busca de quem ela fora como explicação para tudo quanto depois fizera. Houve quem estranhasse a quase ausência de Ulay na detalhada sucessão do seu percurso, tanto mais que, dois anos antes, haviam tido memorável reencontro no MOMA aquando da performance The Artist is Present, mas num percurso tão longo quanto multifacetado entende-se que a estrutura da peça tinha de fazer opções, mesmo que difíceis. Sobretudo pelo que a rutura significara para a protagonista.
Doravante apontarei sempre Bob Wilson´s Life and Death of Marina Abramovic como um dos grandes filmes da minha vida.

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