Olhando-se para «Baile no Moinho de La Galette» não se julgaria que Paris estivera a ferro e fogo cinco anos antes, quando a Comuna de Paris procurara derrubar um regime que, fraco perante os fortes, acabara de se curvar perante os prussianos e, ao invés, impunha à sua população uma existência miserável e ditatorial. Esse é o aspeto mais paradoxal, que fica desse quadro, porque Renoir toma como motivo a alegre e festiva convivência dominical, alheado das alternativas e sórdidas realidades, que, por essa altura, tanto motivavam os escritores realistas.
Renoir nunca revelará particulares inquietações sociais, escudando-se numa estética influenciada pelas, então muito na moda, estampas japonesas, refletida na paleta muito colorida com que representa amigos, conhecidos e outros figurantes a dançarem e a conversarem ao som das mazurcas e das polcas, interpretadas pela orquestra que, sugerida ao fundo, consubstancia o ideário impressionista, de que esta obra se tornaria um dos principais títulos.
Diz-se que, concluído o quadro, Renoir começaria a sentir as poliartrites a condicionarem-lhe os movimentos dos dedos. Mas o desvio ao figurativismo mais ortodoxo nada devia a essa limitação física, que o não impediria de ainda produzir obra vasta e comercialmente bem sucedida.
Um século depois, outra artista, Niki Saint-Phalle também exploraria as cores mais luminosas para dar corpo a algumas das suas esculturas mais representativas, as Nanas, figuras redondas, matriarcais, que deveriam contribuir para a alavancagem do estatuto da mulher numa sociedade contra cujas desigualdades começavam a lutar. Integrando-se no movimento feminista da época, ela viria a radicar-se na Califórnia nos anos 90, quando lhe acabara de morrer o marido - o também artista Jean Tinguly - e os pulmões indiciavam os efeitos da utilização intensiva de um material tão agressivo quanto o é o poliéster.
Nesses últimos dez anos de vida, passados na região de San Diego, e continuando a ter em mente o Parque Guell em Barcelona, replica a criação de um novo espaço ao ar livre, no meio do qual distribui as suas obras mais recentes. Assim fizera em Itália com o Jardim dos Tarots e repete no Círculo Mágico da Rainha Califia, com estátuas-totens influenciadas pela simbologia da cultura ameríndia, que ela pretendia revalorizar.
Comparando as obras de Renoir e de Niki Saint-Phalle pode-se considerar que constituíram testemunhos vibrantes das épocas em que viveram, mas com ambições opostas quanto à intenção de com elas influenciarem os quereres dos seus contemporâneos.
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