Conta-se que Luigi Pirandello estava em Lisboa, quando se estreou «Douro, Faina Fluvial» de Manuel de Oliveira. E o filme suscitou-lhe tal agrado que, quando ouviu a pateada dos espetadores no final, perguntou a quem o acompanhava se os portugueses aplaudiam com os pés.
A estória é contada por João Botelho no filme de homenagem ao seu mestre, sobre quem lembra, igualmente, a frase certeira de João César Monteiro: perante a sua obra, havia só uma de duas soluções, ou se encolhia o realizador, ou se alargava o país. E de facto o talento de Oliveira era maior do que a limitada dimensão do país e, por isso mesmo, foi mais admirado e premiado lá fora do que dentro de portas. Porque por cá funcionava o interesse pelo conteúdo das histórias que adaptava a filme, quando importava , sobretudo, a forma como o fazia. Há nele uma forma de filmar, que muito deve ao teatro e à pintura, podendo-se olhar para muitos fotogramas de cada filme como autênticas obras-primas a valerem só por si mesmos. E também a inspiração no cinema mudo, que começou por ser a sua escola de aprendizagem para um certo modo de ver e de ouvir, mormente quando os gestos apenas se faziam acompanhar do elucidativo silêncio.
Botelho não poderia ter optado por melhor forma de homenagear Oliveira ao escolher a adaptação de um dos seus projetos nunca concretizados, e dando-lhe substância nessa matriz original, em que os sons apenas são os da banda sonora, porque a narrativa suporta-se em legendas intercaladas entre as diversas cenas, com o preto-e-branco a evidenciar uma estética entre o construtivismo e o expressionismo.
Depois de assistir a tão estimulante documentário cresceu a vontade de revisitar toda a obra de Oliveira e constatar-lhe a nunca por demais incensada genialidade.
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