domingo, fevereiro 07, 2021

(DL) O espírito do lugar segundo Lawrence Durrell

Colhi assinalável prazer da leitura do Quarteto de Alexandria ou do Quinteto de Avignon, mas surpreende-me o alheamento manifestado por Lawrence Durrell em relação à política, quando eram tantos os intelectuais da sua geração a militarem ativamente contra a assustadora progressão do fascismo no continente europeu. Foi, de facto, em 1935 que, cansado da cinzenta Inglaterra, Durrell foi-se instalar em Corfu. Tinha 23 anos, acabara de se casar com Nancy e apetecia-lhe outro tipo de paisagem tanto mais que a Grécia de então nada tinha a ver com a depois desvirtuada por incomensuráveis hordas de turistas.

Se nos primeiros meses viveram com outros familiares em Kontokali, que ainda tinha algumas características citadinas, ambos optaram por mudarem-se para o lado nordeste da ilha, o mais selvagem, onde só contariam com o convívio de pescadores e camponeses. Foi aliás na casa de uma família de gente ligada à pesca, que eles se hospedaram.

Durrell andava fascinado com a descoberta do Trópico de Câncer de Henry Miller e decidiu ser essa a via literária, que pretenderia replicar. O escritor americano não tardou a fazer-lhes companhia durante algumas semanas surgindo daí uma amizade, que perduraria para o resto das respetivas vidas.

Durrell passava o tempo a colher as experiências propiciadas pelas atividades da região, acompanhando os pescadores na sua faina ou tendo longas conversas com os monges ortodoxos, que lhe permitiam realimentar a espiritualidade resultante da educação num colégio jesuíta.

As páginas que foi preenchendo surgiriam no seu Caderno Preto ou no romance então em gestação, Panic Spring, ainda muito influenciado pelo amigo. Mas começa a criar um estilo próprio, uma voz só sua, que se tornaria inigualável nos seus melhores romances.

Em 1939 a aproximação da guerra fê-lo atravessar o Mediterrâneo para Alexandria, na outra margem, mas Corfu permanecer-lhe-ia como o paradigma do espírito do lugar. Porque, segundo ele, deveríamos sempre assumir dois sítios que definíssemos como os que correspondam à nossa natalidade: aquele onde nascemos, mas também o outro, aquele onde mais gostamos de estar.

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