Problema bicudo o que os mandões da Fox tinham para resolver nesse ano de 1929, quando a América afundava-se na Grande Depressão, mas Hollywood punha a cadeia de produção a carburar a velocidade de cruzeiro, por não faltarem espectadores dispostos a gastarem alguns cêntimos para sentarem-se nas salas escuras e viverem através da tela os sonhos negados pela América das falsas oportunidades.
Raoul Walsh adiantara-se a John Ford, que já tinha o assistente de aderecista debaixo de olho como dotado de pinta suficiente para o converter em galã de cinema. Em The Big Trail contava transformar o carregador de cenários no intrépido caçador Breck Coleman, que aceitava liderar uma caravana de colonos através do trilho de Oregon à conquista do Oeste, mas ansiava cruzar-se no caminho com os assassinos de uma amigo a quem pretendia vingar. Mas como vender ao público, que o ator chamava-se Marion Morrison? Poderia alguém com nome de mulher credibilizar-se em papéis acentuadamente masculinos?
Durante umas horas conjeturaram que nome dar-lhe. O de um herói da Guerra Civil, já que os pais tinham-no crismado precisamente com o nome de um deles? Alguém sugeriu Anthony Wayne, que também ganhara fama no conflito entre os unionistas e os confederados. Mas logo houve quem receasse a redução de Anthony para Tony, italianizando a identidade do potencial galã. Foi então que outro dos presentes aventou John. R assim ficou dado como John Wayne, um pseudónimo que viria a ser muito mais do que isso, porque, sempre de mal consigo mesmo, Marion tudo faria para colar a sua personalidade à imagem fabricada, que essa nova identidade pressupunha.
Quem não gostou nada da cooptação do rapaz por um rival foi Ford, que deixou de lhe falar durante um par de anos. Marion, que nele projetara a imagem ideal de um pai substituto do natural, entretanto falecido, viu-se perdido como órfão à deriva. Anos a fio os estúdios utilizaram-no em dezenas de títulos de série B, rodados em poucas semanas, uns a seguir aos outros. Às vezes até o sujeitavam ao ridículo como acontecia no filme em que era pistoleiro cantor, mas a voz a dobrá-lo nas canções tão diferente da sua, que só a capacidade crítica do público de então aceitava sem contestação.
Não fosse Ford a vir salvá-lo desse pântano em que se via enleado e nunca lhe teríamos sabido da existência. Para ele os sucessivos desempenhos em filmes merecidamente esquecidos eram apenas a solução de emprego para quem muito dificilmente encontraria alternativa viável na América dos milhões de desempregados de então.
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