Que grande epopeia é a rodada por Raoul Walsh há noventa anos! A História do Cinema reconhece-a como o primeiro western falado havendo muito nele a enaltecer. Em primeiro lugar o facto de ser meio documentário, meio filme convencional, ao aliar as soberbas paisagens do Wyoming e o quotidiano de um grupo de pioneiros a desbravar o Oeste selvagem com a convencionalidade de uma intriga romântica e uma história de vingança desenvolvidas de acordo com os padrões narrativos da época.
A Fox rodeou-se dos maiores cuidados para que a obra saísse memorável de forma a homenagear o acontecimento histórico, então objeto de comemoração centenária: contratou Raoul Walsh para realizá-la por ser um dos mais experientes realizadores dos seus quadros já que tendo iniciado a atividade em 1912, chegou a esta superprodução com quarenta filmes no currículo.
Colocaram-lhe à disposição oitenta atores, dois mil figurantes índios, mil e oitocentos cavalos e catorze diretores de fotografia, metade deles comprometidos com a versão em 35 mm, e a outra metade com a de 70mm, que deveria dar aos espectadores uma sensação de impressionante majestosidade das paisagens ... se existissem salas apetrechadas para assim a exibirem. E, durante um ano, sempre nos mesmos sítios percorridos pelos pioneiros dessa primeira investida de pioneiros pelo trilho do Oregon, Raoul Walsh lá foi criando a obra.
O lado documental resultou das sequências, que espelharam as maiores dificuldades por que passaram os migrantes depois de terem partido do local onde Breck Coleman - John Wayne no seu primeiro desempenho como protagonista! - tomaria a sua liderança. A descida de uma falésia particularmente inclinada, a travessia de rios turbulentos, o ataque dos índios, o desafio representado pelo deserto ou a tempestade de neve, serviram de demonstração dos obstáculos vencidos pelos pioneiros para alcançarem aquela que entendiam vir a ser a sua Terra Prometida. Em cada uma das dificuldades o protagonista fazia uso dos talentos inerentes à condição de herói. Daí que cumprisse o objetivo principal do que planeara, quando começara por aceitar o emprego - vingar-se de um rufia, que lhe matara o melhor amigo - e, no final, ter a bela de serviço a cair-lhe nos braços depois de quase a ter perdido para um jogador profissional cheio de manhas.
Há outro aspeto assaz curioso a sublinhar a seu crédito: a forma como ilustra os índios, explicitando-lhes a razão de quererem defender uma terra que era sua, mas ainda assim aceitando quase sempre a mediação de Breck para não levarem o conflito com os intrusos a dimensões particularmente sangrentas. Antecipando-se aos filmes da década de 60, que procurariam dar uma perspetiva menos eurocêntrica da conquista do Oeste, este filme de Walsh não recorre ao maniqueísmo primário de tantos westerns posteriores para criar uma falsa mitologia dos confrontos entre cowboys e índios.
Grande terá sido a deceção dos executivos da Fox, quando constataram o inesperado flop financeiro, que o filme implicou. Se a versão widescreen - aquela que poderia abrir a boca de espanto aos espectadores, não conseguiu ser distribuída, a outra, a de 35mm, não convenceu quem queria mais ação e menos sociologia.
The Big Trail conheceria, porém, o apreço dos historiadores e críticos, que não o deixaram cair no esquecimento e até foram determinantes para que uma cópia magnificamente restaurada viesse a integrar a antológica coleção da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos.
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