domingo, dezembro 01, 2019

Microformatos: Sejamos então imprescindíveis!


Foi por José Mário Branco, que cheguei ao conhecimento do admirável percurso de Paul Ehrlich enquanto cientista. E é um exemplo que vale a pena ter sempre presente, por servir de resposta eloquente a quem se atreve a dar o marxismo como morto e, com ele, um modelo socialista de sociedade, que substitua o atual com merecido sucesso. Nesta altura em que o capitalismo dá demonstrações plenas do seu esgotamento, compreende-se que os seus defensores queiram macular quem proclama a racional e auspiciosa alternativa. Uma proposta teoricamente formulada há mais de cento e setenta anos num texto que se limitava a constatar o óbvio: a história da Humanidade sempre resultou e resultará da dialética luta de classes.
O bacteriologista alemão, que ganhou o Nobel em 1908, dedicou parte substancial da vida a procurar a cura para uma das mais terríveis doenças do seu tempo: a sífilis. E esbarrou em sucessivos fracassos. Mesmo quando parecia próximo de o alcançar, o objetivo ia-se adiando em função dos sucessivos malogros.
Não sei se foram noventa ou novecentas as desilusões colhidas quando a esperança lhe parecia acenar com o pretendido desiderato. Só sei que foram muitas! Mas ele nunca desistiu até ao dia em que, finalmente, viu a doença dos seus pacientes darem sinais inequívocos de remissão.
O autor de «Margem de certa maneira» não tinha ilusões quanto à iminente vitória do ideal igualitário. Por muito que nos custe ainda teremos de passar por muitas ilusões e desilusões. Como aconteceu na Comuna de Paris ou na Revolução Bolchevique, na China de Mao ou na Cuba de Fidel, no Chile de Allende ou no Maio de 68 em Paris. E assim teria efetivamente de acontecer porque as condições materiais, que o tornariam possível nesses binómios de espaço e de tempo ainda não se concertavam de forma a resistirem aos ataques de quem sabe iminente o novo, mas tudo faz para preservar o mais possível o velho e decadente mundo da desenfreada financeirização de tudo quanto envolve a atividade humana.
Ehrlich nunca desistiu, porque sabia como do seu êxito beneficiariam milhares, se não mesmo milhões de doentes. E teimou, teimou até vencer.
Dos muitos legados deixados por José Mário o desta história é particularmente útil. Porque, como Brecht o definiu existem homens que lutam um dia e são bons. Os que o fazem durante um ano e ainda são melhores. E muito melhores os que porfiam durante muitos anos. Mas imprescindíveis - aqueles que melhor contribuirão para a cura dos nossos males económicos e sociais—são os que lutam toda a vida.
Do José Mário, de Ehrlich ou de Bertolt Brecht fica o apelo para que sejamos, tanto quanto possível, imprescindíveis.

1 comentário:

Luís Manuel Anacleto disse...

Desconhecia o percurso tão exemplar deste cientista e homem solidário. Concordo plenamente com o teor do comentário.