quinta-feira, dezembro 05, 2019

Diário de Leituras: A forma de habitar o mundo segundo Jean-Paul Dubois


Regressando uma última vez ao romance de Jean-Paul Dubois, que recebeu o prémio literário francês mais prestigiado de quantos todos os outonos são anunciados, lembrar-se-á que se trata da estória de um homem encerrado num cárcere do Québec a olhar para o passado e a nele identificar tudo quanto viveu até esse presente em que mais nada lhe parece restar.  Evoca o pai, que era pastor protestante e se deixou enredar no abismo da dependência do jogo, a mãe egoísta e invocando o direito à felicidade para fazer infelizes quem mais deveria compensar, ou Winona, a companheira índia, morta num acidente de aviação, e que lhe dera a conhecer as alegrias do amor mais intenso. E há, sobretudo, esse Kieran Reid, condómino do edifício Excelsior, que nunca o traíra, continuando a visitá-lo na prisão e contando-lhe as muitas histórias recolhidas na sua atividade enquanto «cartógrafo da infelicidade alheia».
O prémio revelou-se bem merecido tendo em conta que, através de tantos personagens, é toda uma diversificada amostragem da presente humanidade a desfilar perante o nosso olhar de leitores agarrados a um desiderato, que nunca adivinhamos qual será. E, numa entrevista ao blogue Diacritik, o escritor não ilude o propósito que o move no seu labor: “Todas as histórias que fiz, sempre incluíram uma posição política. Como Godard estipula, escolhe-se a perspetiva que se pretende. Na história que criei o narrador é sempre o tipo sem poder, que não o quer, mas não suporta quem ouse exercê-lo sobre si. Posiciono-me sempre ao lado dos que sofrem. O problema é saber como sair desse sofrimento. Quais os métodos utilizados para tal e até onde se pode aplicá-los. É nessa questão que me coloco, porque é aí que entra a política e me faz escolher qual o lado por que me bato. A exemplo dos filmes de Ken Loach, que são formidáveis e políticos. Porque ele não esconde de que lado se coloca...”
Para quem também nenhuma dúvida alimenta sobre qual o posicionamento a tomar perante todas as injustiças e igualdades do mundo em que vivemos, Dubois confirma-se como um dos escritores atuais, que podemos contar entre os nossos...

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