A tragédia que tem envolvido a Venezuela , sobretudo desde a morte de Hugo Chavez, propicia discursos simplistas sobre um regime, que pretendeu reduzir as desigualdades sociais existentes antes de se tornar poder, e convertido numa ditadura militar, com inquietante perda de apoio daqueles que haviam sido os seus maiores apoiantes. Tanto mais, que basta pensar nos clientes de Paulo Núncio para compreender como a corrupção foi fenómeno, que Chavez não conseguiu ou não quis evitar.
Tem sido revoltante o oportunismo dos que, à conta de tal pretexto, diabolizam a generalidade da esquerda, e a ideologia marxista em particular, como se, afirmando-nos socialistas em Portugal, tivéssemos de arcar com os pecados dos que assim se reclamam onde quer que seja.
Esquecem, ou querem esquecer, que Chavez começou por ser um entusiasta da Terceira Via de Blair até que os impasses dessas falsas soluções conduziram à deriva para o voluntarismo fundamentado numa retórica de esquerda, mas de escassa solidez no domínio dos fundamentos teóricos, que a deveriam consubstanciar em estratégias consistentes.
Torna-se por isso interessante ler o romance de Alberto Tyszka, até por o sabermos confesso opositor do regime e a viver no México numa espécie de exílio voluntário, mesmo que continue a visitar regularmente o seu país.
O protagonista, Miguel Sanabria é um velho médico, especialista em oncologia, que tem algo em comum com a maioria dos venezuelanos: a família conta com apoiantes entusiásticos do chavismo e dos seus mais tenazes opositores. O que testemunha fraturas, que superam o universo dos conflitos sociais: os núcleos familiares desestruturam-se por essa quase inevitabilidade de muito se amar ou odiar o regime.
«Pátria ou Morte» tem como contexto o ano da morte de Hugo Chavez, desde o anúncio da sua doença até ao desenlace fatal.
Através dos seus personagens, Tyszka mostra como a realidade venezuelana não se compadece com análises simplistas, merecendo ser vista na sua complexidade depois de despojadas as excessivas emoções.
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