Em adolescente fui ávido leitor de Júlio Verne, que cedo me deu a noção de não ser muito difícil ver concretizado muito do que ali era apresentado como versátil exercício de imaginação. Claro que tive desilusões, e oh se elas foram mesmo incomensuráveis!, como a de, há muito, estar convencido de nunca vir a ter a excitação de sair da atmosfera terrestre e olhar para o planeta azul a partir de uma perspetiva distante enquanto viajante espacial. Algo que, uma semana depois de ter feito treze anos, acreditava piamente possível enquanto via Armstrong e Aldrin a enviarem as imagens do seu primeiro passeio lunar para os nossos ecrãs a preto-e-branco.
Vem isto a propósito da surpreendente notícia colhida esta manhã numa revista científica: não tanto o facto de, na próxima década, a grande maioria dos automóveis já contar com assistente vocal a indicar os percursos aconselháveis até aos locais de destino, mas o facto de, nalguns deles, decerto os de gama mais alta, essa voz provir de equipamento capaz de uma interação empática com o condutor. O que significa contar-lhe uma anedota se o sente tenso, mudar a música ambiente consoante a necessidade de o acalmar ou o sacudir da letargia do cansaço, ou interroga-lo se, face ao volume de tráfego e às consequentes paragens, está disposto a tentar percurso alternativo mais longo, mas menos demorado. Uma máquina, pois, que ajusta a intensidade luminosa dentro do habitáculo de acordo com as expressões faciais, os ritmos cardíacos ou a respiração do condutor. E que com ele interagirá com o desvelo de uma esposa, de uma mãe.
O gadget chegará a tal sofisticação, que a revista coloca como hipótese a possibilidade de o condutor ganhar súbita paixão por tal presença constante nas suas deambulações automobilísticas. O que teria para os sexólogos uma sugestiva novidade: abrirem consultas para tratamento de uma nova parafilia.
Hipótese estapafúrdia? Não sei! Posso pelo menos conjeturar possível tendo em conta tudo quanto se incrustou nos nossos quotidianos, e inimaginável há vinte, há trinta, há cinquenta anos!
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