Ao cirandar por Haia nas últimas duas semanas era fácil identificar qual o grande acontecimento cultural da cidade no ano em curso: a comemoração do centenário do lançamento do movimento De Stijl, que começou pelo lançamento de uma revista e se tornou numa proposta estética de vanguarda, imbuída de confiança no progresso, no otimismo e no humor. O seu mais conhecido promotor foi o pintor Piet Mondrian cujas célebres pinturas, com linhas retas e vibrantes cores primárias, apareciam reproduzidas em andaimes de prédios em construção, em cartazes e outros suportes publicitários.
A exposição destinada a consubstanciar a homenagem está no Gemeentemuseum, o Museu Municipal, e por lá continuará todo o ano, juntando não só a riquíssima coleção da instituição como as que foram emprestadas pelo Moma e outros importantes detentores de obras do pintor e, muito particularmente, do seu amigo Bart van der Leck, que lhe serviu de cúmplice criativo, muito embora as expressões de um e de outro seguissem por vias completamente diferentes.
Só tivemos disponibilidade para a visitar na véspera da partida e as surpresas foram múltiplas: uma delas tem a ver com o facto de Mondrian ter começado por ser um pintor paisagista, retratando nas telas os polders e os moinhos a exemplo de tantos outros artistas anteriores. Por essa altura um os seus melhores amigos terá sido Van Gogh antes deste demandar o refúgio francês em Arles.
Uma viagem a Paris causou-lhe uma viragem significativa no trabalho, por influência do cubismo e das teorias teosóficas que, por essa mesma altura, tanto interessavam Fernando Pessoa.
Investindo em estudos da cor e na forma do ovo, que simbolizava o início de algo de novo, ele irá depurar mais e mais as formas até alcançar a mais pura abstração.
Se o design holandês é, hoje em dia, do mais inovador que se conhece, muito deve ao empurrão estético proporcionado por Mondrian e outros artistas do mesmo movimento.
Embora ainda vivesse mais um quarto de século essa opção abstracionista manter-se-ia irreversível a partir desse ano de 1917, ainda testemunha de outra grande revolução política na Rússia que seria, artisticamente, acompanhada de propostas artísticas com algumas semelhanças com as congeminadas na Holanda. Falamos necessariamente dos suprematistas de Malevich e outros grandes pintores vanguardistas soviéticos.
Longe de se esgotar numa só visita, será provável que voltemos a esta exposição quando regressarmos a Haia a meio do verão. Poderemos, porventura, explorar melhor o imenso labirinto do Gemeente, em que, além desta homenagem, tem outras não menos interessantes propostas temporárias e uma riquíssima coleção permanente onde figuram os maiores artistas dos séculos XIX e XX, desde Monet a Picasso, de Louise Bourgeois a Francis Bacon, de Van Gogh a Sol Levitt.
Após a descoberta do Panorama Mesdag e já tendo apreciado ao vivo os Vermeer do museu Mauritshuis e as impressionantes ou até divertidas obras de Escher, dá para concluir o quanto Haia ainda tem para culturalmente nos impressionar.
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