Há olhos que nos interpelam como se, tantos anos passados, continuassem a interrogar-nos quanto aos porquês. Porquê os filhos ou os netos desaparecidos sem nunca mais se ter conhecido o seu paradeiro? Porquê se terem visto violados, torturados, assassinados? Porquê terem perdido os melhores anos das suas vidas e os remanescentes nunca mais os possam resgatar?
Mas também há quem se escuse a olhar para a câmara refugiando a atenção no que se vê da janela aberta. Talvez porque há também a vergonha de se ter sobrevivido, com tantas memórias para assombrar as longas noites de insónia.
Existem também os arquivos de gente assassinado em valetas, à beira da estrada, dentro de um carro. E os sítios onde tudo se passou, a maior parte abandonados porque comportando fantasmas, que mais ninguém quer enfrentar.
Existe o avião de um suporte publicitário, que serviu em tempos para dele se precipitarem presos para as águas do oceano ou do rio de la Plata. E a vergonha dos carrascos a taparem os rostos para que não se lhos imortalize como símbolos da perfídia, da crueldade.
A exposição, que estará no Torreão Poente do Terreiro do Paço até 2 de julho, recorda como se cometeram os piores crimes quando uma superpotência arregimenta militares para que lhe sirvam os interesses, mesmo que à custa da maior barbárie. Tudo perpetrado enquanto estavam Johnson, Nixon, Ford, Carter e Reagan na Casa Branca.
Não é que as fotografias de João Pina surpreendam esteticamente. O seu interesse é outro: denunciar os crimes relacionados com a Operação Condor, perpetrados contra ativistas políticos chilenos, argentinos, uruguaios, brasileiros e paraguaios. E lembrar como a América Latina teria podido ser completamente diferente se a CIA não cuidasse dela tratar como se fosse coutada privativa sem a mínima tolerância contra quem o não aceitasse...
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