Não tivesse Katie sofrido um acidente no dia em que fizera condenar mais um homicida e não teria ido parar ao hospital Westlake. Esse acaso suscita-lhe duas diferentes novidades: uma é necessitar de operação ginecológica para a inibir das suas excessivas hemorragias menstruais. A outra, mais singular, é a de ter julgado ver da janela do seu quarto alguém a transportar o corpo da vizinha da irmã para um carro. Mas esta sensação perturba-a: como estava atordoada com os sedativos tratara-se de algo de concreto ou de alucinação? Até ver nada a convence da primeira possibilidade.
A verdade é que Vangie Lewis, essa vizinha de Margaret, aparecera morta em casa, depois de ingerir quantidade significativa de veneno e causando séria comoção nos vizinhos, que a sabiam prestes a dar à luz.
Mary Higgins Clark, a autora policial de que aqui damos conta a respeito do seu romance »The Cradle Will Fall» («O Berço Cairá» e não o “colorido” título escolhido para a tradução portuguesa—«A Clínica do Terror»), faz-nos depois acompanhar os dias movimentados do dr. Highley, o dono desse hospital, que anda a fazer investigação mediante a inserção de fetos retirados dos ventres de jovens decididas a abortar, para os implantar nos de mulheres impossibilitadas de serem mães. Para a alta sociedade local, que lhe financia os estudos e a clínica, ele é visto como uma espécie de santo milagreiro, que garantira a alegria da paternidade a quem dela já se julgava excluído.
Sociopata, que não olha a meios para conseguir a glória científica a que almeja, ele vai multiplicando crimes, que se interligam numa lógica de causa-efeito. Assim, depois de Vangie, mata Edna, a assistente, que encontrara no parque de estacionamento a bota perdida da assassinada, seguindo-se-lhe o dr. Salem, um conceituado ginecólogo a quem ela estava disposta a confiar o parto. Ora o cientista partilhara com Highley um período de estágio em Oxford e já ali constatara os escassos escrúpulos éticos no exercício da profissão.
Para complicar mais a intriga, e fazendo-nos cúmplices do conhecimento de quanto a polícia vai estando enganada, todas as culpas tendem a ser endossadas ao marido de Vangie, comandante de uma empresa aérea disposto a romper o casamento em prol de uma nova tentativa de felicidade com uma hospedeira. Por inabilidade ou azar, não só é ele a descobrir o cadáver da mulher, como está nas proximidades dos locais dos crimes, que vitimam Edna e Salem. E a polícia rapidamente tem disso prova.
Levando ao extremo a capacidade de criar suspense, Mary Higgins Clark faz com que Katie vá mesmo deixar-se operar pelo dr. Highley, que está decidido a aproveitar a oportunidade para a matar durante a intervenção, porque lhe adivinha as suspeitas.
Claro que tudo correrá bem e Katie salvar-se-á in extremis, enquanto o mau da fita se suicida com o mesmo veneno, que administrara a Vangie.
Numa história tipicamente concebida para garantir receitas pródigas nas adaptações para cinema ou para televisão (fica aqui proposto o link para a versão realizada em 1983 por James Llewellyn Moxey, com Lauren Hutton e James Farentino nos papéis principais) ficam as sugestões ambíguas sobre o aborto ou a forma como a ciência investiga novas possibilidades.
Fica a demonstração de como leitura light pode comportar mensagens subliminares direcionadas para determinados estímulos ideológicos.
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