sexta-feira, dezembro 16, 2016

(DL) O Comboio do Luxemburgo

Por muito que ainda sobrem por aí alguns energúmenos capazes de o admirarem, Salazar foi, incontestavelmente, o maior biltre do século XX português. Os seus crimes são tão numerosos, que um julgamento do tipo do organizado em Nuremberga contra os líderes nazis, envolveria igualmente imensos volumes de informação. E. convenhamos, que a mesma justa punição.
Salvando-se do juízo dos tribunais, o ditador não se livra do que o sujeita a História através de sucessivos ensaios como o agora acabado de sair «O Comboio do Luxemburgo» da autoria de Irene Pimentel e Margarida Ramalho. Em todos eles é réu comprovadamente culpado das malfeitorias, que se lhe atribuem.
O que aí se conta ocorreu em novembro de 1940, quando um comboio oriundo do grão-ducado, com 293 judeus escoltados por soldados alemães, foi mandado parar em Vilar Formoso e dali não passou nos dez dias seguintes.
Terrível essa espera ao frio intenso de novembro, sem alimentos e sem autorização para sequer irem à casa de banho. Os únicos mantimentos, que chegam aos refugiados são os propiciados pela população da pequena vila, que demonstrou uma compaixão para com os infelizes, ignorada por Salazar. Este já permitira a entrada de dois comboios com trânsfugas do  nazismo, mas se o primeiro passara sem dificuldades na direção de Lisboa, o segundo haveria de ver-lhe dificultada a passagem só aceite in extremis, já prenunciando o que viria a suceder com o comboio seguinte.
Despeitado com o ato corajoso de Aristides Sousa Mendes que, nesse verão, contribuíra decisivamente para a salvação de tantas vidas humanas, Salazar apenas toleraria, e mal, que os judeus autorizados pelos nazis a aqui virem embarcar nos navios com destino à América, fizessem do território português uma mera e curta passagem, sem aqui se fixarem. O que poderia não suceder com alguns dos 293 passageiros deste comboio, que teriam comprado vistos em Antuérpia, dificilmente aceites no destino do outro lado do Atlântico.
Durante a dura provação à vista da fronteira, que lhes poderia significar a salvação, um dos passageiros morre e está sepultado no cemitério local. Os outros são mandados para trás, havendo pelo menos cinco dezenas, que acabariam  por morrer nos campos de extermínio. Os demais conseguiram sobreviver, ora por conseguirem fugir para a então França Livre, ora por, sendo ricos, pagarem por novos vistos pelos quais teriam aberta nova alternativa para a salvação.
Quando nos insurgimos com o fascista húngaro, que iniciou o processo de rejeição dos refugiados vindos do Médio Oriente, com a implantação de muros e cercas de arame farpado, esquecemos que o regime salazarista procedeu do mesmo modo rejeitando aos refugiados das perseguições nazis o porto de abrigo  de que tanto careciam...


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