Por coincidência vi agora o mais recente filme de Edgar Pêra na mesma altura em que decorre o Festival Queer no São Jorge, sobre a mesma temática em que se insere. Embora não seja o que mais gosto do realizador - continuo a ter «O Barão» como o que mais me impressionou! - não deixo de reconhecer a graça e a inteligência com que trata o tema do escritor de sucesso, que acorda um dia esquecido da sua condição homossexual.
Numa altura em que alguns andaram a vampirizar as comédias dos anos 30 e 40 como oportunidade de negócio, esta proposta revela como é possível fazer comédia em Portugal sem os exercícios de preguiça inerentes a querer atualizar o que não se justifica, por só ter piada no contexto histórico em que surgiu.
Há a oportunidade para recordar Nuno Melo e Nicolau Breyner, com este último a emitir uma das premissas por que passa o filme: ao contrário da tese absurda, que ainda vai fazendo escola em certos círculos ultraconservadores, a homossexualidade não é vista aqui como doença. Pelo contrário se João foi acometido da sua amnésia e se redescobriu heterossexual foi porque teve um pequeno derrame cerebral e deixou de reagir de acordo com a sua verdadeira natureza.
É claro que temos de aceitar como do domínio do género o histrionismo de vários atores, mas há que reconhecer a capacidade de contenção de Miguel Borges no estereotipo do «macho latino», que lhe foi atribuído. Ademais há a considerar que, como em todos os filmes de Pêra, é entusiasmante seguir a sua opção por certos enquadramentos de câmara, que configuram o seu inimitável estilo.
Tudo acaba de acordo com o cânone das comédias: o casal provisoriamente desavindo reencontra-se e a má da fita (a rival que roubara o romance quase acabado do protagonista!) devidamente castigada.
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