Na sequência da perda dos territórios coloniais após a derrota na 1ª Guerra Mundial, a Alemanha viu-se forçada a desenvolver a indústria farmacêutica para compensar a inacessibilidade das substâncias medicinais anteriormente dali oriundas. Particularmente bem sucedidas as empresas desse setor não tardaram a criar drogas, que inundaram todos os setores sociais sem prejudicar a condição de maior exportadora mundial de heroína e de morfina, que a Alemanha conquistou na segunda metade da década de 20.
Eivados do seu propósito purificador os nazis prometeram combater esses paraísos artificiais, que conotavam com a decadência promovida pela coligação judaico-bolchevique. Mas isso não impediu que, em 1938, os laboratórios Temmler tenham publicitado a distribuição de uma nova metanfetamina designada como pervitina. Tratava-se de um potente psicotrópico, cujos efeitos secundários eram escamoteados pelo fabricante.
Estudantes, engenheiros, investigadores, cientistas, donas-de-casa, médicos e enfermeiros renderam-se entusiasmados a uma solução tão exaltante contra a fadiga, o excesso de peso e a depressão.
O consumo expandiu-se de baixo para cima na escala social, coincidindo com um notável crescimento da economia e a imposição do Grande Reich. E suscitando uma dependência incontornável por toda a Alemanha.
A Wehrmacht não tardaria a adotar a pervitina como o produto ideal para transformar cada soldado na réplica mais aproximada do mito nazi do guerreiro ariano, insensível ao medo e à dor.
Aquando da invasão da Polónia em 1 de setembro de 1939, uma parte significativa dos envolvidos revelava-se alegre e disciplinada graças à referida metanfetamina.
Da mesma forma, o ataque fulminante contra as tropas franco-britânicas, em 10 de maio de 1940, tinham sido precedidas da encomenda de 35 milhões de doses à Temmler para utilização dos soldados alemães.
O historiador Marc Bloch assinalaria, num dos seus livros, que existia uma energia admirável nos vencedores desses combates, capazes de suportarem 48 horas sem dormirem, nem quase comerem. Goebbels enaltecia-lhes o mérito, declarando-os invencíveis na profusa propaganda distribuída sob as suas ordens.
Nenhuma importância era então atribuída ao crescimento significativo de casos de hipertensão e de inexplicáveis crises cardíacas. Como poderia ser de outro modo se o responsável pelo recurso à pervitina era também dela dependente e mantinha a tese da sua importância estratégica?
De qualquer modo é excessiva a conjetura de Norman Ohler em «L’Extase totale. Le IIIe Reich, les Allemands et la drogue », agora publicado na editora La Découverte: segundo diz, a História europeia dos anos 30 e 40 teria sido completamente diferente se os alemães não tivessem recorrido intensamente a esse fármaco. Ora a derrota nazi na sequência do fracasso da invasão da União Soviética é explicável por muitos outros fatores, que marginalizam a importância desta droga para probabilidades residuais. Fazer dela a “explicação”, que arrumaria com todas as outras não deixa de ser prova de insensatez ou de mera esperteza para vender muitos livros...
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