Sem prejuízo de, na próxima semana, dar tempo de antena a uma das mais execráveis figuras que anda por aí a pavonear-se na pele de «historiadora», associando-se a Rui Ramos em teses ideologicamente trogloditas - falo obviamente de Fátima Bonifácio! -, Maria João Seixas regressou à RTP para um programa de entrevistas, que tenta recuperar outros do mesmo género em que fez escola.
Para começar, e bem!, convidou o fadista Ricardo Ribeiro, que é sempre um gosto ouvir, quando começa a falar da sua arte. Para além de me ter proporcionado um dos melhores espetáculos deste ano - o que partilhou com Rabih Abou Khalil nos Dias da Música no CCB! - ele partilha connosco muitos dos conhecimentos, que a sua inesgotável curiosidade leva sempre a procurar.
Aos 34 anos, e oriundo de um estrato social onde os rendimentos eram limitados, é sem quaisquer complexos que lembra os tempos felizes de pastor na Moita do Ribatejo, quando já não havia capacidade económica da família para o manter a estudar. Nesse sentido é admirável o esforço autodidata, que personificou, ostentando agora, e sem qualquer prosápia, a enorme cultura de que, entretanto, se dotou.
É por isso que só nos podemos associar ao seu repúdio pelas utilizações oportunistas do fado, que cingidas a motivações económicas, desrespeitam a tradição. Adivinhou-se que ele tinha nomes a aflorar-lhe aos lábios que só a presença das câmaras o forçava a silenciar-se, mas como não pensar em tanta gente, que nunca viveu o fado nos sítios onde ele se criou e julga-se com capacidade para o cantar só por ter voz mais ou menos afinada?
Tem sido uma das consequências da inclusão das casas de fado nos roteiros turísticos da capital - mobilizando cada vez mais dinheiro e visitantes! - essa tentação para aceitar a (falsa) genuinidade de muitas vozes. É que, como gracejava alguém, arriscamo-nos a tropeçar numa qualquer pedra da calçada de Lisboa e daí fazer emergir mais um fadista.
O pior é a perda da sua identidade, a transformação em algo, que parece fado, soa a fado, mas está muito longe de o ser. E Ricardo Ribeiro dá na entrevista um exemplo eloquente: é como se pedíssemos um cozido á portuguesa e o víssemos chegar à mesa com a «originalidade» de lhe terem associado natas!
Sem comentários:
Enviar um comentário