Vincent Van Gogh tinha vinte cinco anos, quando chegou à região de Borinage, na Bélgica.
Estava-se no outono de 1878 e ele abandonara os estudos de Teologia, que poderiam fazê-lo aceder à condição de Pastor como o pai. Embora o tenha sempre procurado tomar por modelo, Vincent sofre com o facto de não conseguir equiparar-se-lhe: por muito que se tenha sempre esforçado, sempre se sentiu aquém das suas expectativas.
Ainda se o irmão mais velho, que morrera à nascença e também se chamara Vincent, tivesse sobrevivido! Talvez a responsabilidade não lhe pesasse tanto nos ombros.
Sem saber muito bem o que fazer na vida, a possibilidade de se instalar naquele recanto da Bélgica para evangelizar os mineiros e as suas famílias, surge-lhe como uma oportunidade a não descurar.
Mas depressa concluirá que de pouco consolo lhes servirá a leitura da Bíblia, quando a miséria em que vivem é a mesma que levará Émile Zola a descreve-la em «Germinal» década e meia depois.
Penaliza-o o facto de, conforme relata nas cartas ao irmão Théo, viver numa “aldeia que cheira a abandono, a silêncio e a morte, porque a vida é passada no subsolo”.
Ele bem gostaria de dar sentido aos seus dias, mediante a ajuda que pudesse prestar aos vizinhos, mas reconhece-se como “um lar em que ninguém se quer vir aquecer”.
A experiência de descer às entranhas da terra mudará para sempre o futuro pintor. Tanto mais que, dias depois de a tal se ter aventurado, alguns dos mineiros que conhecera morrem numa terrível explosão.
Ter vivido as trevas a centenas de metros de profundidade, incitá-lo-á doravante a procurar incansavelmente a luz.
Já tinham passado dois anos sobre a sua chegada ali e conclui definitivamente quanto ao que quer fazer no futuro: desenhar e pintar os pobres e a paisagem. Até porque conclui que “a arte é o homem acrescentado à natureza”.
Quando, destituído das funções pastorais para que fora designado, põe-se a desenhar quase sem parar: “esta luta aparentemente terrível é um trabalho de aprendizagem. Primeiro a dor, depois a alegria”.
O documentário de Henri de Gerlache foi produzido para ser lançado enquanto dura a atual exposição «Van Gogh au Borinage», que, de janeiro a maio, é uma das principais importantes iniciativas de Mons enquanto Capital Europeia da Cultura de 2015. Da sublimação dos rostos mascarrados de carvão até à busca pelas luzes deslumbrantes do Sul da França, Van Gogh vemos lutar contra as suas próprias sombras.
(texto sobre o documentário «Van Gogh: le choix de peindre» de Henri Guerlache)
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