terça-feira, fevereiro 25, 2020

Ideias: Quando o Trabalho assumiu a forma de mercadoria...


Relativamente ao conceito de Trabalho põe-se sempre a questão de saber se estamos a discutir palavras ou coisas concretas. Karl Marx tendia a circunscreve-lo a tarefas por conta de outrem e remuneradas com um salário. É uma das premissas fundamentais dos seus textos mais importantes, mesmo reconhecendo a natureza do trabalho não remunerado das mulheres nas famílias proletárias, mas fundamental para que os maridos melhor se vissem espoliados das mais-valias pelos respetivos patrões. Mas ninguém duvida que esse ofício de donas-de-casa a tempo inteiro ou depois em part time quando regressavam dos seus empregos, é Trabalho. Até mesmo as crianças, apesar da proibição do trabalho infantil pela OIT, não deixam de cumprir um Trabalho, quando vão para a escola e as incentivamos a que trabalhem arduamente. E alargando o conceito do Trabalho para além das fronteiras que nos costumam servir de referência, não podemos ignorar o que é executado pelos animais. Não costumamos usar a expressão «trabalho de formiga»?
Se entendermos Trabalho como o empenho investido na transformação de algo que existe noutra coisa que nos traga valor acrescentado, estamos a entendê-lo como existindo desde os alvores da Humanidade e acompanhando-a enquanto ela perdurar. Só que a forma moderna do Trabalho, tal qual foi formatado pela ideologia capitalista, não possui essa dimensão intemporal sendo específica de uma conceção de sociedade, que justifica o nosso descontentamento. Porque o vemos negativamente como perda de tempo, por se opor ao lazer e ao consumo, embora financiando o seu acesso. Mas Simone Veil refere que, para além da função de transformar o mundo, o Trabalho também contribui para o comando de nós mesmos. O que pressuporia o carácter distópico de uma sociedade em que se pudesse dispensar o trabalho, atribuindo-o exclusivamente a robôs, porque seria inevitável a tendência para imprevisíveis comportamentos irracionais perante a inexistência de um sentido para se viver, de uma missão que pelo seu sucesso nos responsabilizasse.
No século XIX o capitalismo transformou o Trabalho numa mercadoria. E Marx debruça-se sobre as características dessa mercadoria que ganhava uma dimensão mais ambiciosa do que a havida quando o Trabalho tinha por específico objetivo a garantia da sobrevivência, nomeadamente através da caça, das colheitas de frutos ou do cultivo dos cereais. Nessa nova abordagem implica o salário e a dissociação do trabalhador dos seus utensílios de trabalho, doravante propriedade do patrão. O capitalismo vai-se assumir como o sistema em que se opera a privatização dos meios de produção, um dos quais o Trabalho mediante um salário e requisitos para ser desempenhado.
Marx distingue o Trabalho da força de trabalho: esta é a capacidade para fazer algo ou seja contempla o tempo que o capitalista compra ao trabalhador e selado por um contrato. Mas para auferir o almejado lucro o patrão deve explorar ao máximo essa força de trabalho, acumulando capital por conta das mais-valias entre o valor da mercadoria produzida pelo trabalhador e o respetivo custo. E esse inevitável conflito de interesses alimenta a dinâmica da luta de classes.

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