quarta-feira, fevereiro 12, 2020

Diário das Imagens em Movimento: «Valsa Real» de Jean Grémillon (1935)


A maior diferença entre um cinéfilo e um espectador de cinema, mesmo que seu assíduo frequentador, é a atitude perante aquilo que se exibe no ecrã. Enquanto ao segundo basta o entretenimento em si, satisfazendo-se na possibilidade de vivenciar um momento agradável, o amante do cinema procura ir mais além, preocupando-se com as opções do realizador na forma como enquadrou os personagens, estruturou a intriga ou comandou a montagem, sem esquecer o contexto da realização do filme, quais as preocupações evidenciadas e quanto poderá ter determinado influências nas obras posteriores.
O filme de Jean Grémillon, que a Cinemateca exibe na próxima sexta-feira, pouco interessará os tais espectadores de cinema, que o considerarão demasiado datado e sem grande interesse para quem se focaliza nas preocupações do nosso tempo. Mas para os cinéfilos constitui a oportunidade de voltar à obra de um dos grandes realizadores franceses da primeira metade do século XX, imerecidamente esquecido em detrimento de um Jean Renoir com quem se lhe podem reconhecer pertinentes afinidades.
Homem de esquerda, que se viu obrigado a cumprir encomendas pouco consonantes com o seu reconhecido talento - e este pode ser considerado um desses títulos menores da sua limitada filmografia! -, Grémillon assinara alguns documentários de referência na época do mudo e viria a aproximar-se dos surrealistas, quando Breton ainda não dissociara o movimento da política mais ativa. Porque, dois anos depois deste Valsa Real, Grémillon iria à Espanha republicana coassinar com Luis Buñuel um filme (Centinela, alerta!) de apoio ao governo legítimo, confirmando as preocupações sociais, que quase sempre sugeria nas suas criações.
O que interessa neste filme, que tem uma estória muito básica - os equívocos amorosos da aristocracia alemã na corte de Munique em 1852 com Sissi a orquestrar a harmonia das soluções conjugais do desenlace - é a singeleza dos seus números musicais, que iam ao encontro do gosto popular e alimentavam um alfobre de influências, que viriam a traduzir-se em muito do que se tornaria a chanson française  nas décadas seguintes...

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