segunda-feira, julho 15, 2019

(DL) Fraternidade, náufragos e um conselho de Saint-Exupéry


1. Porquê a Fraternidade? Interroga-se Edgar Morin no seu mais recente opúsculo publicado pelas Ed. Actes Sud. E sessenta e quatro páginas bastam para recuperar a importância de um dos três emblemáticos valores da Revolução Francesa e, dentre eles, porventura o mais desvalorizado. Para o velho filósofo a fraternidade é “esse meio de resistência contra a crueldade do mundo. (...) O objetivo não deve ser um termo, mas tornar-se num caminho, o nosso caminho, o da aventura humana”.
Tenho-o assumido nestas publicações bloguísticas: as esquerdas não têm de procurar novos caminhos, porque eles estão bem definidos em duas simples evidências: que a História do mundo continua a ser a da sempiterna luta entre as classes dominantes e dominadas em cada momento e que mantém-se a plena atualidade da Declaração Universal dos Direitos do Homem enquanto linha de separação entre o progresso da civilização e o seu inaceitável retrocesso.
2. Sylvain Tesson é um dos mais conhecidos escritores do género de literatura de viagens tão apreciada em França e que merece importante festival literário anual em Saint-Malo. Numa crónica ele considera os naufrágios como suscetíveis de muito contribuírem para a educação humana. Veja-se o percurso iniciático de Ulisses, regressado a Ítaca com um saber de experiência feito muito mais profundo do que tinha quando partira. Ou Robinson Crusoe, que procurou replicar na insular a civilização de que se vira involuntariamente afastado. Sobretudo quando apareceu Sexta-feira e o tomou como escravo em vez de o fazer seu igual. Ou os personagens da ilha imaginada por Marivaux em que os escravos invertem a ordem social e tornam-se eles os senhores.
Pelos exemplos pode concluir-se que os náufragos escusam-se a criar utopias nos seus cenários selvagens, antes ocupando-se em restabelecer ordens hierárquicas quase sempre de carácter autocrático.
3. Perante esta perspetiva pessimista valerá dar-lhe o contraponto de Saint-Exupéry, que nos incentivava a fazer da nossa vida um sonho, e dos nossos sonhos a realidade.

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