Herman Melville embarcou no baleeiro «Acushnet», quando tinha vinte e um anos, depois da estreia como embarcadiço num navio mercante dois anos antes. A opção marítima surgira-lhe como recurso de sobrevivência perante a falência da família depois da morte precoce do progenitor. Foi assim que, em 1841, se viu a aportar à baía de Taiohae, na ilha polinésia de Nuku Hiva, pertencente ao arquipélago das Marquesas.
O fascínio por esse cenário luxuriante na caldeira de um antigo vulcão foi imediato: na sua perspetiva o Paraíso bíblico poderia igualar-se-lhe em beleza, mas nunca superá-lo. Contá-lo-ia no seu primeiro livro, «Typee», publicado em Londres cinco anos depois e que suscitou um enorme interesse pelo relato de quem se anunciava como tendo vivido numa tribo de canibais.
Poderemos presumir que Melville não seria muito diferente do nosso Fernão Mendes Pinto, aproveitando para ir acrescentando um ponto à medida que ia avançando no seu conto até que ele alcançasse a dimensão de um verdadeiro romance. De facto, embora corroborado pelo seu cúmplice Toby, a narrativa de Melville afiançava ter sido de quatro meses a estadia na ilha, depois de ambos desertarem do navio baleeiro, quando, na realidade, só durara um mês. Não é, igualmente, certo que fosse o estímulo da aventura a levar ambos os marinheiros a fugirem do navio e a internarem-se selva adentro até chegarem a Taipivai três dias depois, muito feridos e sedentos, sendo recebidos em festa pela tribo dos Typee, que aí vivia.
Os franceses ainda não tinham iniciado a ocupação colonial da ilha pelo que os brancos eram uma novidade para os inesperados anfitriões. Cumulá-los de atenções foi algo que levou Melville a considerar se eles não se revelariam mais civilizados do que os bélicos ocidentais.
Aproveitando a estadia, Melville armou-se de empírica curiosidade de antropólogo atentando em todos os detalhes da vida dos polinésios, sobretudo nas suas cerimónias religiosas destinadas ao culto dos antepassados representados em estátuas de pedra a lembrarem, em dimensão bem menos ambiciosa, as da ilha de Páscoa. Foi então, que Toby e Herman sentiram calafrios, ao participarem nas oferendas aos deuses, entre as quais se incluíram sacrifícios humanos. A exemplo de outros povos antropófagos os Typee comiam partes dos corpos dos que aprisionavam, crentes que deles recolheriam o vigor e os poderes.
Temendo que, apesar das promessas em contrário, não tardassem a servir de iguaria gastronómica aos hospedeiros, os dois homens fugiram, Toby primeiro, Herman logo de seguida. Retornando à costa ambos seriam recolhidos por navios diferentes, que os levariam de regresso a portos mais tranquilos.
Melville demoraria a passar a escrito as suas vivências mas, quando o fez, garantiu pronta publicação nos dois lados do Atlântico Norte. Sucesso, que não repetiu quando, cinco anos depois, lançou «Moby Dick», já que o seu romance mais conhecido só viria a merecer reconhecimento mundial no século XX, quando redescoberto do injusto esquecimento.
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