«Em 1994, no vigésimo quinto aniversário da alunagem da Apollo, o Washington Post publicou os intrigantes resultados de uma sondagem recente: 20 milhões de americanos pareciam acreditar que a alunagem era uma mistificação encenada pelo Governo no deserto do Arizona, em nome dos benefícios financeiros das grandes empresas que tinham contratos com a NASA. Uma das conclusões secundárias era que as pessoas do Oeste tinham duas vezes mais tendência para aceitar esta teoria conspirativa, o que era um ótimo exemplo de como um ceticismo deformado, levado longe demais, acabava por se transformar em credulidade inocente.
E no entanto se se quisessem provas para sustentar a ideia de que o Governo se metia em contos do vigário desta amplitude, bastaria recordar o projeto de colonização das terras áridas. Em 1909, o Governo tinha realmente largado aquelas pessoas numa extensão de terra que se assemelhava suspeitosamente à superfície lunar. O projeto tinha sido apresentado ao Congresso realmente para lucro das poderosas companhias ferroviárias. Se as pessoas do Oeste manifestavam agora uma desproporcionada desconfiança no Governo e nas grandes empresas, pelo menos tinham na sua história um acontecimento que poderiam brandir triunfantemente como prova do ceticismo das suas suposições.
Saberia o Governo que a terra distribuída seria a longo prazo incultivável e que o projeto acabaria em sofrimento? Duvido muito. Tal como os seus eleitores, os políticos da era Roosevelt acreditavam fervorosamente nos poderes miraculosos da nova ciência agrícola. Os diretores das companhias ferroviárias, como Albert J. Earling e James J. Hill, estavam sob o efeito do mesmo feitiço. O espírito dominante em 1909 era o idealismo otimista, compartilhado equitativamente pelos emigrantes do Oeste e os ditos poderes.
Mas houve real falsidade no modo como o projeto foi publicitado. Os redatores (que provavelmente nunca tinham posto os olhos na pradaria) e os grafistas criaram uma região no papel, tão ilusória como a Árvore das Patacas. A linguagem e as imagens enganadoras das brochuras acabariam por dar razão aos colonos que se sentiam vítimas inocentes de um Governo que estava nas mãos dos maganões da companhia — e este sentimento de terem sido traídos haveria de se manter em ferida através de gerações.» (pág. 342-343, ed. Quetzal)
Há cento e dez anos vagas sucessivas de emigrantes acorreram às vastas extensões do Montana a pretexto de se tornarem proprietários de quintas de uma dimensão inimaginável para quem vinha da miséria que grassava pelos quatro cantos da Europa. Ante a promessa de grandes apoios, quer tecnológicos (o Manual Campbell, sobre as melhores práticas para transformar todas aquelas planícies num enorme vale verdejante), quer em créditos bancários, iludiam-se com um sonho que nunca viveriam.
Quem promovia aquela que viria a revelar-se uma enormíssima burla eram as companhias ferroviárias, desejosas de rentabilizarem o negócio, que as fizera marcar aleatoriamente no mapa as cidades, que lhe serviriam de estações para embarque e desembarque de passageiros e mercadorias.
Grande parte desses colonos zarparam tão só concluíram que a miséria ali padecida era igual ou pior do que haviam anteriormente conhecido. Mas os resistentes ganharam um tal ódio a tudo quanto viesse com o carimbo federal, que se enraizaram num comportamento abertamente fascista. As sinistras Milícias do Montana e os associados da NRA (National Rifle Association ) adotaram o Estado como terreno fértil para a sua cultura belicista. E, quer o Unabomber, quer Timothy McVeigh (autor do atentado do Oklahoma), ali foram preparando as atividades por que viriam a ser tristemente conhecidos.
Não admira que Trump não tenha ali concorrente possível, quando se recandidatar a novo mandato na Casa Branca. Ainda que amistosamente recebido por muitos anfitriões, que o ajudaram a construir a história de uma América nada consonante com a dos miríficos sonhos, Raban não deixou de sentir a silenciosa hostilidade de quantos lhe adivinharam a condição de liberal vindo de uma das elitistas cidades costeiras. A história familiar de dolorosos fracassos demorará muito tempo a aligeirar o ressabiamento de sucessivas gerações de frustrados.
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