domingo, setembro 16, 2018

(I) Retrato de Freud quando jovem


Quando Sigmund Freud começou a interessar-se pelos sonhos dos seus pacientes vienenses, os colegas consideraram-no louco, sem imaginarem que estava-se a inventar a psiquiatria moderna. Ele sabia bem o que pretendia porque, acometido de vários tipos de neurose, ensaiara na autoanálise as estratégias de prospeção do inconsciente que haveria de praticar junto dos que acorriam ao seu consultório em busca de cura para os males. Tratava-se de ir às profundezas do inconsciente e ali indagar o que tinha sido banido da consciência: fantasmas de incesto, de homicídio e de ódios reprimidos. Para escândalo de muitos, atribuiu a razões sexuais na infância a origem de muitos desses problemas psíquicos, abanando o falso tabu da inocência assexuada das crianças. De súbito viu-se acusado de produzir material pornográfico, de ser um libertino e ter uma mente doentiamente debochada.
Nascido em 6 de maio de 1856 na pequena cidade moldava de Freiberg, era filho de um comerciante de lanifícios, que vivia amedrontado pela vizinhança antissemita acostumada a manifestar-lhe evidente hostilidade. Com 42anos, Jakob era vinte anos mais velho do que Amali, a terceira esposa. A família vivia numa moradia demasiado exígua para o casal e o jovem rebento, porque tinham de contar igualmente com dois meios-irmãos já adultos. O jovem Freud deve ter sentido uma enorme confusão para identificar quem era quem naquela casa em que o pai tinha idade para ser seu avô e os meios-irmãos poderiam passar perfeitamente por maridos da sua mãe.
A confusão ainda mais se terá agravado, quando tinha dois anos e a mãe teve um novo bébé, Julius, que morreu seis meses depois. Essas experiências de nascimento e morte poderão ter sido bastante perturbadoras para o petiz.
Em 1860 os Freud mudaram-se para Viena, uma das grandes capitais europeias, onde existia um abarrotado gueto judeu. A família ia crescendo: aos dez anos Sigmund contava com cinco irmãs e um irmão, mas era o preferido dos pais, que lhe proporcionavam um quarto só dele, onde podia ler e estudar.
Aluno brilhante na escola judaica, também tratava de estudar outras línguas noutros estabelecimentos de ensino: aos doze anos conseguia ler Shakespeare no original e era fluente em seis idiomas. Obcecado pelo estudo, tomava as refeições no quarto para prosseguir as leituras enquanto comia.
Uma das suas rotinas era registar todos os sonhos de que se lembrava, invariavelmente heroicos, identificando-se com Napoleão e com desejos de vingança contra os antissemitas.
Em 1873 entrou para a Faculdade de Medicina da Universidade de Viena, aí fazendo um aturado estudo sobre os órgãos sexuais das enguias. Julgava assim aceder à desejada carreira de investigador, mas a quota de judeus estabelecida para a seleção de quem seria para tal cooptado, excluiu-o, razão porque decidiu ganhar a vida como médico. Apaixonado por Martha, uma amiga da irmã, ansiava podê-la pedir em casamento. Após quatro anos de namoro por correspondência, já que ela vivia na Alemanha, pode dar o nó, apesar de ter um rendimento reduzido como interno de medicina no Hospital de Viena na área das doenças nervosas. 

Sem comentários: