sexta-feira, abril 28, 2017

(A) Voltar para trás 130 anos... e apreciar!

Esta tarde fomos viajar no tempo subindo ao topo de Seinpostduin, então a maior duna de Scheveningen. Do alto do miradouro, olhámos para a praia tal qual se apresentava aos observadores de 1881. Virando-nos 180º estava a cidade de Haia na mesma altura.
O trompe l’oeil revelou-se tão bem conseguido que, após a ilusão inicial, olhámos melhor para o enorme telão que nos rodeava e confirmámo-lo como uma pintura imensa a ocupar 1600 m2, com 14 metros de altura, outros tantos de areias da praia a separarem-nos dele e um diâmetro total de 120 metros nos seus 360º.
Apeteceu ali ficar para uma apreciação demorada de cada pormenor: os barcos na praia, os que navegavam ao largo, o exercício de um batalhão de Cavalaria, a mulher do autor instalada no areal com o seu cavalete e protegida do sol pela sombrinha branca, as aves (enormes em evidente erro de perspetiva) a sobrevoarem-nos nos céus, as cenas do quotidiano nos bairros de pescadores, os hotéis de luxo já instalados a norte. E tantos, tantos outros detalhes, que Hendrik Willem Mesdag , a esposa Sientje  e um conjunto de  colaboradores ligados à Escola de Haia, levaram quatro meses a criar.
Logo na abertura ao público o Panorama Mesdag foi visitado por um atento Vincent van Gogh, que comentou:  "A única coisa errada sobre esta pintura é que não há nada de errado com ela."
Hendrik e Seintje só tinham tido um filho que, aos oito anos, morreu de difteria. O que levara a jovem mãe a iniciar-se na pintura, que até então só deixara como atividade exclusiva do esposo, tornando-se-lhe doravante ativa colaboradora. Este tomara como tema de estimação dos quadros os motivos marítimos, mas de forma muito distinta de Turner, que era bem mais epopeico e possuía paleta de cores bem mais expressiva.
Quer com a chegada dos navios a porto, quer com os efeitos de uma tempestade nos que estavam na praia, quer enfim na muito glosada cena de naufrágio, Mesdag ficou para a História da Arte como um pré-impressionista com particulares ligações à escola de Barbizon.
Embora criticado como artista menor nos Países Baixos do seu tempo uma medalha de ouro conseguida no Salão de Paris tirou espaço de maledicência aos detratores, que passaram a reconhecer-lhe o valor.
Quer nos quadros expostos no rés-do-chão, quer depois no acesso ao «miradouro» do primeiro andar é inevitável confirmar esse talento e a atenção dedicada aos pormenores mais imaginativos para credibilizar a hábil utilização da perspetiva na eficaz ilusão de tridimensionalidade.
Curioso ainda o filme projetado no percurso para a saída sobre o restauro operado no telão a partir de 2010. A degradação, acelerada pela construção do adjacente Hotel Hilton, ameaçava-o colapsar.
Se Mesdag e os colaboradores mal tinham passado os cento e vinte dias na sua criação, a recuperação da obra com recurso aos mais avançados recursos tecnológicos, demorou vários anos. O que cumpre a velha regra de ser muito mais difícil, caro e demorado a recuperação do que se estragou, do que o tempo levado a construi-lo...


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