O meu filme preferido de Werner Herzog é «Aguirre, o Aventureiro», que abordava a expedição do vice-rei do Peru, Pedro de Ursua, em 1560, apostada na procura das cidades míticas da vasta região partilhada pelos rios Orenoco e Amazonas.
Acompanhado pela mulher, a quem ia oferecendo banquetes frívolos e noites escaldantes, o chefe da aventura seria assassinado pelo lugar-tenente, Lopo de Aguirre, que se transformaria numa espécie de Coronel Kurtz («Apocalipse Now»), ao proclamar-se solitário imperador do vasto território, habitado sobretudo por macacos.
Era uma viagem às cada vez mais profundas trevas da floresta, transformada numa descida aos infernos feita de febre, delírio, de consumo da poderosíssimas ayahuasca.
Marco Steiner, que prefacia a edição de «A Lagoa dos Belos Sonhos» de Hugo Pratt, aborda os contrastes entre as lagoas de Veneza e as do atual Suriname, que surgem nas quatro histórias dos inícios dos anos 70 e tendo Corto Maltese como protagonista.
Se outrora os conquistadores espanhóis perdiam-se em buscas de ouro, os do século XX procuraram petróleo, minérios (bauxite) e as plantas há muito conhecidas pelos índios, que as farmacêuticas trataram de patentear para que mais ninguém as pudesse utilizar.
Não admira que Pratt tenha escolhido essa região como espaço privilegiado de algumas das estórias do seu personagem, mesmo trazendo-o amiúde a Veneza, como se fosse a cidade dos doges o que mais se poderia aproximar do conceito de porto de registo dos seus vetustos trampões.
O traço de convergência de Aguirre e Corto Maltese é a assumida solidão de ambos. Embora os oponha a ambição de poder de um com o desapego do outro.
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