terça-feira, setembro 29, 2020

(DL) Pobres Homens Brancos

 


Num ensaio acabado de publicar a historiadora Sylvie Laurent aborda a construção ideológica relativa ao branco pobre norte-americano, que tão bem serviu a estratégia de Donald Trump para chegar à Casa Branca nas eleições de novembro de 2016. Muitos aceitaram de bom grado a tese da angústia identitária de um segmento importante da população mais desfavorecida, temerosa de se ver desapossada dos parcos haveres pelas minorias, que as tenderiam a discriminar para franjas ainda mais irrelevantes da sociedade em que vivem.

E, no entanto, esse eleitorado de Trump não se resume aos operários do Michigan ou aos mineiros do Wyoming, já caídos no desemprego ou em riscos de lhes caber essa triste sorte. Na realidade o conjunto dos eleitores de Trump são mais ricos que a média americana, com realce para a elite conservadora já anteriormente conotada com os neoconservadores e com o Tea Party.

O Make America Great Again encontra raízes nos medos dos Pais Fundadores da nação quando aprovaram a Constituição em 1787. Já tendo iniciado o genocídio dos índios e perspetivado o enriquecimento à custa da mão-de-obra escrava, eles tinham presente o livro de Edward Gibbon, publicado onze anos antes, e dedicado ao Declínio e Queda do Império Romano. Daí que, para acautelarem os potenciais ataques dos novos bárbaros - esses índios e escravos - perspetivaram o texto fundamental da jovem república numa lógica de autoproteção e autopreservação. A célebre Segunda Emenda sobre o direito a andar armado tem nesse enquadramento histórico a sua fundamentação.

Nos quase duzentos e cinquenta anos, entretanto decorridos, tal dilema ficou vincado no imaginário coletivo e tem sido difícil erradica-lo. Foi explorando-o que os antigos esquerdistas transmutados nos neoconservadores nos anos 70, apostados em execrarem o comunismo, cuidaram de definir a identidade norte-americana como tendo por essência o empreendedorismo, a meritocracia e o individualismo. Claro que Nixon, e depois Reagan, os Bush e mais recentemente Trump, logo cuidaram de os chamarem ás respetivas Administrações.

A realidade é porém outra: hoje é necessário somar os rendimentos de treze famílias negras para se igualarem aos rendimentos médios de uma congénere de cor branca. As prisões estão cheias de negros (45%)  e os corredores da morte ainda mais (75%).

As desigualdades de rendimentos entre os brancos e as minorias são gritantes. E dão gás a uma revolução política e social, que não terá fim na eleição de 3 de novembro. 


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