São jubilatórios os dias que os cinéfilos vão vivendo se quiserem arriscar o desconfinamento e deslocarem-se às salas de cinema. A começar pela possíbilidade de rever Os Inúteis, o filme de Fellini sobre os tempos da juventude em Rimini e o seu grupo de amigos permanentemente em farra. Franco Interlenghi serviu-lhe de alter ego, mas também por lá andam Alberto Sordi e Franco Fabrizi a farrearem ao som da música do inevitável Nino Rota.
A passagem à idade adulta é inevitável e Roma afigura-se como destino promissor. Assim o faria o jovem Federico, quando para aí se mudou e foi trabalhar para um jornal onde conheceria alguns dos grandes nomes de argumentistas, que determinariam muito do cinema transalpino do pósfascismo.
Quem foi ao Indie pode ter uma descoberta curiosa num documentário de Ehsan Khoshbakht sobre o cinema produzido no Irão do Xá, quando a CIA já tinha cerceado a vontade de Mossadegh em criar uma república moderna e socialista e Khomeini ainda ali não aparecera a demonstrar que as ditaduras assentes em crenças religiosas conseguem ser tão hediondas quanto as derivadas do imperialismo. Os filmes realizados nesse intervalo entre 1953 e 1979 não tinham grande interesse artístico: eram cópias dos modelos ocidentais ou a reprodução das tradições locais, mas são excelentes objetos de análise para quem quiser debruçar-se sobre esse período na perspetiva do historiador ou do sociólogo. Filmfarsi dá-lhes material interessante para o objeto dos seus estudos.
Do Festival de Veneza os nossos apetites abrem-se para o novo filme de Almodovar, o primeiro em língua inglesa e tendo Tilda Swinton e um cão como únicos personagens.
A Voz Humana de Jean Cocteau já fora por ele citado nalguns dos seus filmes, mas agora, em jeito de curtametragem, Almodovar decide abordar o original naquele que também é o seu primeiro título em língua inglesa. É a história de uma mulher meio-ébria, meio-enlouquecda a quem o amante já não aparece há três dias, pondo fim a uma relação de há vários anos.
A concluir fica uma proposta para quem se acautela, ficando intramuros, e tem acesso à plataforma HBO: Ridley Scott realizou os dois primeiros episódios da série Raised by Wolves, regressando aos temas dos andróides e da religião. Num mundo apocalítico os ateus procuram que dois robôs eduquem uma nova prole de crianças de acordo com a sua explicação do que ocorre à sua volta, mas uns fanáticos religiosos, os mitraístas, já responsáveis pela destruição da Terra, prosseguem o proselitismo assassino no planeta Kepler 22b onde a Humanidade procura sobreviver.
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