Em 1785 o sexagenário Giacomo Casanova era hóspede do conde Joseph Karl von Waldstein num palácio na Boémia e, no intervalo das disputas com os criados, ia escrevendo as Memórias que, fortemente censuradas, só seriam publicadas, postumamente, em 1825.
No filme de Jacquot escolhe-se um dos seus episódios para ser recordado em jeito de flash back num relato que o cansado protagonista faz a uma jovem confidente. Ele tem a ver com a única mulher a quem amou sem dela jamais ficar amigo, porque por se ver na condição de arroseur arrosé: ele que sempre exercera ascendente sobre as companheiras, fascinando-as com os dotes de fogoso amante, confronta-se com uma cortesã disponível para com todos fornicar à exceção dele. Obcecado por possuir essa Charpillon excede-se nas prendas, nas atenções e, quando se julgava à beira do ansiado prémio, eis que dele se vê afastado pela artes dela se lhe furtar.
A frustração basta para o levar quase à beira do suicídio, valendo-lhe um amigo que lhe evita in extremis, o mergulho no Tamisa. Vinte e dois anos depois ele ainda lembra a rapariga com nostálgico amuo por ter sido quem lhe dera a conhecer os tormentos do frustrado desejo.
Para dar substância a esta história, Jacquot socorreu-se de competente reconstituição histórica, irrepreensível no guarda-roupa e nos cenários, tudo envolvendo numa atmosfera crepuscular, condizente com a realidade da época e com a decadência por que passa Casanova. Se este avançava para os últimos treze anos da sua longa vida, a Europa abeirava-se da Revolução Francesa, que viraria do avesso a obsoleta ordem social herdada do distante feudalismo.
Relativamente ao filme a crítica francesa torceu o nariz ao que menos se esperaria: a interpretação de Vincent Lindon, de quem temos conhecido excelentes interpretações cinematográficas nos anos recentes. Mas reconheçamos que, para um Casanova patético na decrepitude, Donald Sutherland e Marcelo Mastroianni revelaram-se mais convincentes nos filmes de Fellini e Scola.
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