Na conclusão do mais recente romance de João Tordo reencontramos uma das características curiosas da sua escrita: essa metaficção, que já em «Biografia Involuntária dos Amantes» o levava a utilizar a personalidade real de um amigo mexicano - o poeta Saldaña Paris - como personagem ficcional do seu romance, ou agora atribui a Lars D. a “verdadeira” autoria de «O Luto de Elias Gro», o título anterior do seu criador.
No epílogo de «O Paraíso segundo Lars D.», a mulher do escritor, que redigia as suas obras sempre de pé sobre uma mesa elevada, também sente o estímulo da ficção, que porventura se revelará no próximo romance, quando Tordo der por concluída a trilogia a que se propôs e de que este é a segunda proposta. Por ora ela percorre o espaço onde o desaparecido estivera no momento de morrer e chega a uma conclusão compensadora: “Baixei a cabeça e, de mãos unidas no colo, comecei a sorrir. Havia um formigueiro na minha pele, que eu senti como uma bênção de outro mundo. Lars estava ali comigo. Abraçava-me. Somos aqueles que chegaram antes de nós e partiremos com todos os que estiveram connosco. Da janela via a linha do horizonte, o fino recorte das águas, e compreendi o encanto daquele lugar. Era o paraíso perdido, o esplendor na relva, glória na flor. Levantei-me e, devagarinho, respeitando o silêncio, fechei a janela.” (pág, 206)
Tordo vai-se confirmando como um daqueles escritores de que estaremos sempre expectantes com o que da sua criatividade vier a seguir…
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