Que eu saiba este filme de Nicolas Klotz não passou em Portugal apesar de contar com Mathieu Amalric e Michel Lonsdale - dois dos melhores atores franceses - nos principais papéis. Trata-se da investigação de um psicólogo na sua própria consciência. Ele é Simon, que trabalha na área de recursos humanos na filial de um grande grupo petroquímico alemão, onde é apreciada a sua eficácia na gestão de despedimentos.
Encontramo-lo quando é incumbido por Karl Rose, um dos principais administradores, da investigar sobre o seu superior hierárquico, Mathias Jüst, que se parece estar em vias de enlouquecer.
Para melhor o conhecer, Simon contacta-o para saber mais coisas sobre o quarteto de cordas a que ele em tempos pertencera, pretextando a ambição de fundar uma pequena orquestra na empresa. Mas, à medida que vai contactando com as perturbações efetivas de Mathias, Simon vai sentindo vacilar o seu próprio equilíbrio interior.
Jüst acaba por revelar a Simon o quanto sabe da sua missão, já que o verdadeiro objetivo de Rose é neutralizá-lo por lhe ter descoberto o passado comprometedor nas Juventudes Hitlerianas. Mas tenta suicidar-se na mesma altura em que, de forma anónima, chega a Simon um documento perturbador sobre a forma de exterminar pessoas em camiões de gás. O autor de tal plano técnico teria sido o pai de Jüst e Simon acaba por descobrir quem lho enviara: Arie Neuman, um antigo membro do quarteto de cordas, que fora uma das vítimas dos despedimentos por si supervisionados.
Encontrando-se com ele, este conta-lhe como vira o pai participar numa captura de judeus durante a guerra, apesar de não passar de um mero polícia, um funcionário como Simon…
Após ter-se interessado pelos sem abrigo («Paria») e pelos sem-papéis («La Blessure»), Nicolas Kltz interessou-se pelo horror económico, investigando os que o fazem funcionar.
O ponto de partida pode lembrar «Apocalypse Now» (um homem incumbido de investigar sobre um superior hierárquico acusado de ter enlouquecido) ao converter-se numa descida aos infernos, mais elegante, mas não menos vertiginosa.
Ambíguo e perturbante, o filme lembra continuamente o atrito entre as imagens e as palavras, entre as sensações e as ideias, resultando numa representação analítica e impressionista sobre os nossos dias.
Pode parecer forçada a comparação entre a Solução Final e os comportamentos das empresas para com quem nelas trabalha, mas continua a tratar-se de jogar com as palavras, envolvendo-as numa aparência técnica de forma a tornar aceitável o inaceitável. Ou seja, a demonstração de como a eliminação do humano na linguagem permite a eliminação desse mesmo fator humano no próprio homem.
Ao passar o genérico final conclui-se que se esteve perante um filme que pensa e faz pensar, com o mérito acrescido de ter apelado a todas as faculdades da perceção e a todas as possibilidades cinematográficas...
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