quinta-feira, junho 06, 2019

(DL) «Leão, o Africano» de Amin Maalouf


No século XVI, Hasan as-Wazzan  contava apenas dez anos, quando chegou a Fez na companhia dos pais e outros familiares, expulsos de Granada pela Reconquista cristã, que tenderia a fazê-los alvos potenciais da Inquisição. À bestialidade perpetrada pelos devotíssimos Reis Católicos também escaparam os muitos judeus, até então a viverem pacificamente na esplendorosa terra andaluz governada por iluminados governantes muçulmanos.
Fez, cidade do saber onde já existia a mais antiga universidade do mundo, a Al Quaraouiyine, fundada em 859, constituía o destino natural da família, ansiosa por encontrar no norte de África uma réplica, tanto quanto possível aproximada, dos encantos de uma Granada doravante entregue à ignorância e ao preconceito dos fanáticos do Deus bíblico.
Hasan-as Wazzan não podia ter encontrado lugar mais adequado para crescer e se educar. Quando, treze anos depois, é capturado por piratas sicilianos, que logo o ofereceram de presente ao Papa Leão X, já detinha um saber tão amplo e profundo de tudo quanto se podia conhecer no seu tempo queo imprevisto anfitrião logo o nomeou geógrafo do Vaticano.
Entre o Ocidente, a contas com a revolução renascentista, e a sua cidade marroquina de adoção, Hasan viveu múltiplas aventuras, que Amin Maalouf romanceou neste «Leão, o Africano», publicado em 1986, que tem o especial condão de nos mergulhar numa época histórica fascinante. Aquela em que na medina de Fez coexistia pacificamente quem possuía credos diferentes e os odores das especiarias misturavam-se com os que, na sua zona central, se ocupavam do tingimento de tecidos, ocupação ainda hoje ali existente e defendida enquanto marca identitária da cidade. Tal qual sucede com os carregadores, que transportam ás costas as mercadorias vendidas nas suas muitas lojas e impossíveis de a elas fazer aceder senão através desses homens encurvados que conhecem como ninguém o labirinto das estreitas ruelas, que a compõe.

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