A aplicação de choques elétricos como terapia para doenças do foro mental ganhou justa má fama nos anos 60, quando a Nova Psiquiatria os execrou como paradigma de uma prática médica quase tão indigna como a que resultara das lobotomias propostas por Egas Moniz, apesar de lhe terem valido o Nobel em 1949. Os anos mais recentes têm, porém, resgatado a eletricidade como ferramenta útil para dirimir alguns dos sintomas mais perturbantes do disfuncionamento cerebral.
A neuro-estimulação está a impor-se como uma técnica avançada no tratamento de certas doenças graves, já não se cingindo aos hospitais, mas também em start ups que, pressentindo-lhe o potencial, andam a criar produtos destinados às prateleiras das grandes superfícies, tendo por indicações a solução para as insónias, a falta de concentração, a melhoria do estado de alma ou a dopagem dos desempenhos físicos.
Estão a surgir aplicações diversificadas desta fascinante tecnologia, embora o cérebro continue a ser um órgão misterioso e em permanente mudança. Os testes demonstram que intervir numa zona do cérebro dos doentes pode ter por consequência a constatação de mudanças profundas e indesejáveis no comportamento. Podem tornar-se tristes, agressivos ou exaltados, temporariamente ou de forma permanente.
Uma das áreas mais promissoras é a da doença de Parkinson com a tentativa de inibir neurónios hiperativos. Mas outros efeitos colaterais andam a surpreender os cientistas, como a menor agressividade e egoísmo dos pacientes a quem aplicaram os eletrodos.
O médico Luc Mollet decidiu estender o estudo a quem sofria de Perturbações Obsessivas Compulsivas, constatando 70% de sucesso na regressão dos sintomas. Um resultado excelente tendo em conta o quão inibidoras podem ser as compulsões relacionadas com a arrumação, a limpeza ou a verificação, que transformam os dias de quem as sofre numa espiral horripilante.
Num filme elucidativo mostra-se um médico a falar de morte e de serpentes a um doente , que reage com cabeçadas na mesa a que está sentado e com o contínuo lamber de uma das suas mãos. Ativando à distância um estimulador, que aplica uma corrente elétrica ao cérebro do homem, logo ele se acalma e consegue falar normalmente sobre a morte e os répteis.
Outra investigadora, que testava a aplicação de eletrodos a doentes com Parkinson chegou a outra descoberta em cobaias a que associava a doença à toxicodependência: ao inibir o núcleo subtalâmico, suspendia a motivação para se drogarem. Não se tratando de uma cura definitiva, essa estimulação permite reduzir o “craving”, ou seja a pulsão irreprimível para fumar, beber ou drogar-se.
Na doença de Alzheimer vários estudos sugerem que a estimulação cerebral poderá ter um efeito neuroprotetor, retardando a progressão da perda da memória. E quanto à anorexia a aplicação dos elétrodos na zona do cérebro ligada à depressão permitiu reduzir a ansiedade a que ela está tão associada.
Estes exemplos, ainda resultantes de investigações em curso, não são definitivos, mas permitem algum otimismo sobre a possibilidade de ver facilitada a qualidade de vida de quem a tem visto condicionada por sintomas que não consegue controlar.
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