quinta-feira, dezembro 20, 2018

(MP) A passagem da sombra para a luz


O papel da luz no interior das igrejas e catedrais medievais merece ser apreciado pelo seu valor simbólico à data da construção. Na Basílica de Santa Maria Madalena de Vézelay, duzentos e vinte quilómetros a sudeste de Paris, ele é notório, particularmente no solstício de verão, quando o caminho de Cristo para o monte do Calvário ganha expressão nas manchas de luz, que pontuam o percurso entre o portal de entrada e o coro. Nesse dia, imitando a via dolorosa, com as sucessivas paragens do condenado para descansar, os crentes estacam em cada uma dessas manchas, sem interromperem o fluxo das rezas, cumprindo assim um ritual que só a eles muito diz.
Os beneditinos, que mandaram construir o edifício no século XII, para servir de escala aos peregrinos, que se dirigiam a Compostela, pretenderam que estes vivessem o deslumbramento de avançarem pela nave na sombra e chegassem junto ao altar, e aí se vissem irradiados pela luz, para eles a expressão do Deus invisível.
Se a arquitetura desse templo ainda obedecia ao estilo românico, a Catedral de Metz, situada ao norte, junto à fronteira com a Alemanha, foi construída no apogeu do gótico. Com mais de seis mil metros quadrados de vitrais, instalados durante mais de três séculos, deveria mergulhar os crentes em sugestivos jogos de cores, por eles entendidos como mensagens divinas de acordo com as referências ilustradas nesses filtros entre o exterior e o interior.
Em ambos os casos os raios solares tendiam a demonstrar a interação entre o material e o imaterial, que explicaria a omnipotência, a omnisciência e a omnipotência divina, razão bastante para que os prosélitos se lhe sujeitassem sem exprimirem a menor duvida quanto à sua substância.
O grande problema para a Igreja Católica terá sido a descoberta da lâmpada. Sem o adivinhar o ultraconservador Thomas Edison deu uma machadada irreversível nos dogmas da fé. A luz divina desmistificava-se e, na sua versão elétrica, garantia o avanço do conhecimento. Mais Ciência significa sempre a perda de influência dos que justificam o inexplicável com a irrealidade de supostas, e inexistentes, entidades superiores.

Sem comentários: