sábado, novembro 09, 2019

Palcos: «Filho?» no Teatro do Bando em Palmela


Chegamos à sala e Aminah direciona-nos para o lugar onde nos sentaremos para vê-la, ao irmão e ao primo mudo a enfrentarem as dificuldades de viverem numa cidade ocupada, acossada pela ruidosa ameaça dos ocupantes americanos nos seus helicópteros. E há o Filho, aquele que a mãe deixou para trás, quando partiu para outro viver, e morre tragicamente como frequentemente acontece com as crianças nos países onde agressores vindos de longe vêm semear o caos e a infelicidade. Do luto o pai sai ao encontrar solução ao adotar outra criança, que a irmã vê como inimiga, por ser outra a sua religião, a cor da pele.
Nesta cocriação do Bando com o Teatrão, a partir de «Para Onde Vão os Guarda-Chuvas» de Afonso Cruz e interpretada por João Santos, Margarida Sousa e Raul Atalaia, está em causa a relação dos pais e dos filhos perante um futuro imprevisível, mas onde se justificam todas as perguntas. Porque as certezas são apanágio dos que agridem e oprimem, dos que segregam e levantam muros. Por isso mesmo o ponto de interrogação será a porta de acesso a um mundo sem fronteiras, quiçá menos desigual. Daí que o espetáculo, direcionado para os mais jovens, faça todo o sentido para eles e para os demais. Porque questiona este presente em que a desconfiança, se não mesmo o ódio pelo Outro, origina a inquietante ascensão das extremas-direitas. E esse é um desafio que tem de ser contido por todos, novos e menos novos.
Para concretizar o projeto, João Neca concebeu um dispositivo cénico muito simples, mas tremendamente eficaz. Porque os muros erguem-se com areia e ela tanto vai assumindo cores distintas consoante o que se quer revelar: o vermelho, por exemplo, para explicitar a morte do Filho.  Em suma, a deslocação a Palmela para descobrir cada proposta do Bando comporta sempre a certeza de regressarmos a casa com a satisfação de havermos assistido a algo de único...

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