sábado, novembro 02, 2019

Apontamentos nas margens das notícias: Entre Nápoles e Ho Chi Minh


Das cidades italianas que conheci, Nápoles rivaliza com Génova quanto à decisão de apontar qual a menos apreciada. De tantas outras - de Roma a Veneza, de Palermo a Florença, de Siena a Milão - conservo imagens gratas, que perdurarão na memória enquanto ela não ceder aos esquecimentos senis. Mas não foi preciso ler os romances de Saviano ou ver as séries deles adaptadas para olhar para a metrópole à beira do Vesúvio e considera-la extremamente feia.
Não fazia planos de lá regressar, mas o documentário sobre a iminência de uma grande explosão, comparável à descrita por Plínio, o Jovem no ano de 79 d.C., ainda mais me desmotivam de tão estapafúrdia hipótese. Nos últimos anos foram vários os sinais do aumento da pressão do magma na caldeira  podendo obrigar à evacuação dos três milhões de habitantes, que vivem na área passível de ser soterrada pela monumental avalancha piroclástica. Mas a questão levantada pelos cientistas é a de repetirem-se os trágicos destinos de Pompeia e Herculano se o fenómeno ocorrer com tão acelerada expressão, que mal dê para sequer lançar os alertas.
Quem não deram a devida atenção aos avisos emitidos por gente particularmente arguta foram os presidentes norte-americanos que, desde Eisenhower até Nixon, foram-se atolando no envolvimento ativo no Vietname, sendo confrontados com a inevitável derrota. Nos dois primeiros episódios da série de Ken Burns para a PBS surgem algumas curiosidades, que me haviam escapado apesar de ter acompanhado a evolução da guerra desde meados da década de 60.
Em primeiro lugar, e apesar de ter tido formação política em Moscovo, Ho Chi Minh até viu com agrado o interesse norte-americano em ajudá-lo a vencer os ocupantes japoneses, tendo na altura um relacionamento amigável com alguns espiões da OSS (futura CIA) para junto de si destacados. Depois foi brilhantemente demonstrado como o ditador sul-vietnamita Ngô Đình Diêm e Ngo Dinh Nhu, seu irmão e sinistro chefe dos serviços secretos, conseguiram desbaratar o já mitigado apoio do campesinato e dos estudantes de Saigão, sobretudo quando quiseram reprimir o budismo, sem levarem em conta ser essa a religião maioritária da população. E embora John Kennedy tivesse consciência do erro de enviar grandes contingentes militares para a Indochina, a intenção de ganhar mais facilmente a reeleição presidencial (fora à justa que suplantara Nixon!) levou-o para uma dinâmica que Lyndon Johnson só teve de prosseguir com os resultados esperados.
Belíssimo trabalho para televisão, «Vietname» é uma das séries de referência dos últimos anos por dar do conflito uma estruturada análise, que arrisco dizer insuperável...



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