sexta-feira, maio 21, 2021

A vida é uma festa! Vivamo-la juntos!

 

Neste momento muito delicado no que vou vivendo, preencher o tempo constitui uma necessidade. Sobretudo para desviar-me, mesmo que ilusoriamente, daquilo que constitui uma obsessão por resolver: existe ou não um futuro em que ainda possa acreditar? É que as semanas vão passando - e já lá vão quase sete! - sem que ocorram mais do que fugazes centelhas, ainda insuficientes para iluminar o túnel opaco em que o quotidiano se transformou. E, de quando em vez, surgem dificuldades adicionais, porque não faltam ameaças oportunistas a intrometerem-se onde já é tão grande a fragilidade imunitária da Elza.

Foi nesse estado de (des)ânimo, que me pus a rever 8 1/2, ciente de nele descobrir algo de novo, invisível nas visualizações anteriores, mas agora realçadas por ser outra a consolidada maturidade. E foi inevitável estabelecer pontes entre os dilemas do desorientado Guido e o que sinto nesta altura. Não por me sentir em défice de inspiração criativa que, essa, tem sido uma inevitabilidade da minha biografia de consumidor de cultura, não de seu criador. Mas há essa sensação de não se ter aproveitado tanto quanto teria sido possível uma relação amorosa, que ajuizava magnífica, mas agora sinto desaproveitada nas muitas cedências ás rotinas, aos constrangimentos circunstanciais. É a velha máxima de se ter sido tão feliz, mas não se avaliar quanto mais se pudera alcançar. Por isso, na cena final do filme, quando Guido se volta a declarar amorosamente a Luísa não posso subscrever totalmente o que ele diz: “Sou como sou e não como queria ser e isso já não me assusta. Dizer a verdade, o que não sei, o que procuro, o que ainda não encontrei, só assim me sinto vivo e posso olhar os teus olhos fiéis sem vergonha, A vida é uma festa! Vivamo-la juntos!”

Quanto a este final não me sobram dúvidas. Já era o que o Captain John Keating dizia aos seus alunos no Clube dos Poetas Mortos: deveríamos usufruir plenamente cada dia da nossa vida.

O que me separa de Guido no filme de Fellini é essa complacência com os seus limites íntimos, porque o outro, aquele a quem se ama, tende sempre a transformarmo-nos em melhores pessoas do que verdadeiramente seríamos à partida. E essa é uma conclusão de que tenho colhido introspetivas provas de há quarenta e seis anos para cá. Sendo verdadeiro como ele reconhece imperativo, mas sem entender assustadora a possibilidade de se ser quem é e não quem se pretenderia ser. Se, segundo Damásio e outros especialistas do cérebro, este é um órgão de notável plasticidade - e é isso que diariamente espero novamente demonstrado desde a dolorosa madrugada subsequente ao dia de Páscoa! - porque o não será, igualmente, o nosso feitio?

1 comentário:

Elsa Razborsek disse...

Acredito plenamente na plasticidade do cérebro e dos benefícios das técnicas de desenvolvimento pessoal. Por isso sim, acredito que também o feitio é moldável -- assim uma pessoa queira realmente mudar!