sábado, maio 01, 2021

(EdH) Há cem anos a emancipação feminina parecia estar iminente

 

Quando se pensa na emancipação feminina são as décadas de sessenta e de setenta do século transato, que nos vêm logo à mente. As grandes lutas e manifestações pela igualdade de direitos ou pela legalização do aborto foram intensas e com resultados incertos, porque se nalguns casos traduziram-se em alterações legislativas coincidentes com esses objetivos, noutros verificaram-se recuos, que tardam em ser novamente corrigidos.

E, no entanto, há cem anos  aconteceu um breve período em que tudo pareceu possível para as mulheres: os homens regressaram estropiados das trincheiras da Primeira Guerra e elas, que tinham mantido as economias a funcionar na sua ausência, sentiram que os poderiam dispensar. Ademais a moral associada à religião levou forte abanão, quando a gripe espanhola matou mais do que a própria guerra, demonstrando a efemeridade de um presente em que tudo podia acabar de um momento para o outro. Sem que servissem de alguma coisa os insondáveis desígnios divinos.

Hollywood e a publicidade criaram novos ícones femininos, que as trabalhadoras dos escritórios ou dos grandes armazéns adotaram como modelos. Clara Bow ou Louise Brooks sugerem o estilo garçonne, próprio dos seus caracteres desenvoltos e orgulhosos pela sua emancipação. A moda começou a transformar-se numa indústria, os Ford T tanto mostraram homens como mulheres ao volante e na União Soviética a comissária Alexandra Kollontai não só fez legalizar a interrupção voluntária de gravidez como criou uma rede de cantinas e creches públicas destinadas a transferirem para o Estado algumas das principais tarefas da mulher trabalhadora.

Foi também a época em que raparigas ambiciosas exigiram o acesso às universidades para se graduarem em cursos até então a elas vedados. Mudaram os padrões de beleza com Man Ray a contribuir para a sua redefinição com as fotografias feitas  a Lee Miller, com esta a não se contentar em ficar desse lado da câmara, passando para o outro e tornando-se numa das mais audaciosas correspondentes de Guerra.

Mantivesse-se essa dinâmica e os anos trinta poderiam ter sido promissores para as aspirações femininas quanto a essa almejada igualdade. Só que aconteceu a Grande Depressão, surgiu o desemprego para milhões de pessoas com os demagogos a verem no regresso das mulheres trabalhadoras ao lar uma alternativa incontornável. Os regimes fascistas impuseram legislações, que as voltaram a secundarizar em direitos e a maximizar nos deveres.  Na URSS de Estaline toda a arquitetura legislativa de Kollontai evaporou-se, equiparando-a à das ditaduras ocidentais.

As mulheres teriam de esperar mais quatro ou cinco décadas para poderem sair do sufoco que lhes voltavam a impor. Embora ainda quase tudo esteja por fazer... 

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