quinta-feira, abril 22, 2021

(DL) Um Conrad a que resisti uns bons anos antes de o ler

 

A primeira vez que O Agente Secreto de Joseph Conrad me apareceu diante dos olhos foi na forma do filme rodado por Alfred Hitchcock em 1936 e a que deu o título de Sabotage. Tinha Sylvia Sidney e Oskar Homolka nos papéis principais e comportava o competente suspense do Mestre mantendo-nos tensos à espera do momento em que a bomba levada pelo miúdo, que atravessava Londres a pé ou de autocarro, iria explodir.

Porque considerei a história tão bem contada, declinei lê-la na forma do romance que inspirara o filme, preferindo outras obras  do autor, que me pareciam mais promissores - Nostromo, A Linha de Sombra, Coração das Trevas ou Lord Jim. Só mais tarde tirei este romance da prateleira e li-o de fio a pavio para nele encontrar aquilo que o Mestre Hitch subalternizara no filme: a mediocridade dos anarquistas que, à exceção do Professor, não pareciam particularmente identificados com as razões ideológicas que lhes fundamentavam as ações, os polícias e os políticos caracterizados como meros fantoches, uma Londres sórdida sem qualquer glamour e um profundo pessimismo na humanidade.

Conrad inspirou-se num caso real ocorrido, de facto, em 1894, quando, a exemplo do que inseriu no romance, um bombista procurara fazer um atentado no Observatório de Greenwich e ficara feito em pedaços, porque a explosão ocorrera antes dele depositar o engenho no sítio aprazado. Aqui temos um lojista, que trabalha para uma embaixada estrangeira e incumbe o jovem cunhado, débil mental, de levar a bomba até ao local pretendido, suscitando a raiva homicida da mulher, que tinha pelo miúdo um afeto maternal. E por isso mesmo mata o marido numa descrição, que constitui um dos grandes momentos do romance.

Para o leitor pode ser incómoda a constatação de não haver nenhum personagem positivo com que se possa identificar: todos eles têm comportamentos e valores, que colidem com o politicamente correto. Daí a escassa comoção quando eles acabam por morrer em circunstâncias invariavelmente violentas...


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