No final da adolescência A Revolução Sexual, Escuta Zé Ninguém e A Psicologia de Massas do Fascismo foram livros, que muito me seduziram por aliarem a psicanálise a uma leitura original do marxismo, permitindo olhar para a realidade dos anos pré e pós Revolução de Abril com outros filtros, que não os das diversas ortodoxias, apostadas em conferirem-lhe interpretações formatadas de acordo com os respetivos cânones.
Por sugerirem interpretações fora da caixa, os livros de Wilhelm Reich foram momentânea moda e acabaram esquecidos nas prateleiras dos alfarrabistas. Não faltaram, igualmente, os detratores, que lembraram a deriva pseudocientífica do autor, quando se exilou nos Estados Unidos e enveredou por estratégias de sobrevivência, que haveriam de o levar à prisão de Lewisburg, onde acabaria por morrer em 1957. Mas Reich fora genial ao olhar para os pacientes deitados no divã como seres, que não revelavam os seus problemas apenas pelas palavras, porque os corpos denotavam tensões, igualmente sintomáticas dos traumas de que se vinham queixar. Por isso mesmo, para escândalo do mestre Sigmund, mandou às malvas a regra de oiro quanto a não haver contacto físico entre paciente e terapeuta.
O corpo surgiu-lhe como fonte de poder perante as tensões emocionais, que deveriam ser libertadas naquilo que designou como streaming. E que assumia frequentemente a forma de orgasmo, porque não era outra a causa das neuroses: a repressão intima das pulsões sexuais.
Quando se entusiasmou com a leitura do Capital de Marx em 1927, intuiu que a transformação do mundo resultaria da associação entre a psicanálise e o comunismo, libertando ao mesmo tempo os traumas individuais e coletivos. Daí que, logo em 1933, analisara, com grande argucia, as estratégias de manipulação das massas, que tinham levado os nazis ao poder.
Constitui um mistério a explicação porque, atravessando o Atlântico e buscando salvação nos Estados Unidos, tenha perdido a lucidez. Mas talvez encontremos resposta no ensaio Everybody, que a britânica Picador irá publicar no final deste mês. A autora, Olivia Laing, promete trazer Reich novamente aos debates atuais. Com pertinência, porque muitas das suas análises e conclusões mantêm singular atualidade.
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