Nos escaparates ingleses apareceu há poucas semanas uma nova biografia de Pavlov da autoria de Daniel P. Todes: «Ivan Pavlov - A Russian Life in Science»
Segundo o autor, o cientista russo correspondeu à colisão perfeita entre religião e a modernidade secular, já que nascera filho de sacerdote e estudara num seminário antes de se tornar num positivista ferrenho. Mudou-o o contexto industrial do final do século XIX, cujos métodos transferiu para o laboratório. Foi assim que os fenómenos nervosos, e até psíquicos, passaram a ser intensivamente medidos.
A Revolução bolchevique melhorou-lhe as condições de trabalho, já que o regime apostou seriamente no financiamento das suas investigações. Não admira, pois, que ele tenha sido um dos principais cientistas soviéticos a ver-se objeto de justificada utilização pelo regime. Ainda assim, não eram poucas as contradições de que dava mostras: ateu convicto, casou com uma colega cientista particularmente dedicada à devoção religiosa. E, quando após uma vida patriarcal mais do que estabilizada, adotou como amante uma outra cientista, também ela casada com um sacerdote ortodoxo.
Mas Todes dedica bastantes páginas à forma como Pavlov trabalhava: caberia ao cientista acumular uma grande quantidade de dados a partir dos quais, e mediante experiências rigorosamente controladas e meticulosamente realizadas, se poderia formular uma teoria consistente. Para ele a ciência assentava no primado da precisão e da quantificação. Até que, chegado ao crepúsculo da sua vida, reconheceu que os cães em que estudava os reflexos condicionados, reagiam de forma mais diversificada do que pretenderia comprovar: a individualidade dos seres complexificava a validade da teoria. Por isso nos últimos anos de vida as investigações tenderam para um rumo nitidamente psiquiátrico. Sem, porém, abdicar da função, que atribuía à Ciência: a de melhorar a sociedade humana.
Sem comentários:
Enviar um comentário